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31 de março de 2020

Livro do Desassossego de Fernando Pessoa e o buraco do espelho de Arnaldo Antunes


"Tenho sonhado muito.
Estou cansado de ter sonhado, 
porém não cansado de sonhar. 
De sonhar ninguém se cansa, 
porque sonhar é esquecer, 
e esquecer não pesa e é um sono sem sonhos em que estamos despertos.
Em sonhos consegui tudo. 
Também tenho despertado,
mas que importa?
Quantos Césares fui?"


Sabe-se que 20 anos de desassossego, foi o que levou Fernando Pessoa  não só a percorrer o caminho tortuoso em busca de sua identidade, como a sustentar tantas desventuras. Encontrar sua avó-louca com certeza  o inspirou  na escrita desse livro.

Na música de Arnaldo Antunes- o buraco do espelho- encontrei semelhanças desassossegadas:

já tentei dormir a noite inteira                          " De resto, com que posso contar comigo?
quatro, cinco, seis da madrugada                      Uma acuidade das sensações, e a compreensão
  vou ficar ali nessa cadeira                               profunda de estar sentindo...
uma orelha alerta, outra ligada                           Uma inteligência aguda para me destruir... " p.51



o buraco do espelho está fechado                    "Mas que pensava eu antes de me perder a ver?     
agora eu tenho que ficar aqui                            Não sei. Vontade? Esforço? Vida? Com um grande
com um olho aberto, outro acordado               avanço de luz. Sente-se que o ceu é já
ao lado de lá onde eu caí                                 quase todo azul. Mas não há sossego"  p.73  F.P.



pro lado de cá não tem acesso      
mesmo que me chamem pelo nome
 mesmo que admitam meu regresso
toda vez que eu vou a porta some
                                                 ..."todas as grandes tragédias da minha vida.
                                                 Nessa região indeterminada, sombria, de
                                                 florestas e sons de água toda, neutral até
                                                 ao ruído das nossas guerras, decorre
                                                  aquele meu ser cuja visão em vão procuro..."
                                                                      p.501 F.P.
                                                      

                                                        
                                                   
Fernando Antunes

Arnaldo Pessoa



             


            (by Luzia Veloso)

                                                                                                   

2 comentários:

  1. Luzia, muito sensíveis, estas tuas relações, este olhar mental e sensível de artista.
    Parabéns!

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  2. Bem legal mesmo, eu já havia usado está música do Arnaldo Antunes para fazer meio que uma intertextualidade com o conto "O Espelho", do Machadão, mas tudo a ver essa tua também, como diria Baudrillard, os espelhos são muito mais superfícies de absorção do que de reflexão ("Da Sedução"), Narciso não se apaixonou por si mesmo, mas perdeu-se na imagem especular que lhe lembrava sua irmã, foi absorvido, por isso morreu, deixou de comer,ter cuidados mínimos por si, foi sugado literalmente, coisa difícil de acontecer com alguém com zêlo acentuado por si mesmo...essas questões são muito interessantes e nunca se esgotam, mas legais as problematizações, beijos e parabéns!

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