Fundado em 28 de Setembro de 1998

28 de setembro de 2021

Marcas de Portugal: Sonia Salim

Ele tinha o coração despretensioso
Era assim religioso
Nasceu na primavera e encantava
Quem o amava e respeitava

Generoso e nascido do Minho
Viu no Brasil a sua segunda pátria
Onde fez amigos e os ajudou
E no coração implantou

Admiração a Portugal
Ensinou coisas simples e grandes
Nos caminhos por onde passou
Conduziu a criança pela mão
Projetou a sua educação
Hoje é lembrança e símbolo
Saudade e certeza
De que a vida pode ser breve
Mas as pessoas de caráter
Deixam o exemplo na vivência 

                                                   @soniasalim    

Poema publicado na Antologia 


"E essa é uma forma carinhosa que preparei para homenagear os portugueses que tão gentilmente visitam o blog Adornando a Vida. Os meus sinceros agradecimentos."

"Agradeço a Deus pela suave existência do tio Manuel (1932-1985) que cuidou de minha educação. Ele nasceu em Paredes de Coura – Minho – Portugal."
                                                                          

27 de setembro de 2021

Uma Estrela entre a beleza e a loucura: Chico Lopes



Tenho certeza de que, se um leitor jovem, da atualidade, for perguntado sobre quem foi Vivien Leigh, pensará muito para responder e, pensando muito, não responderá. Mas, se tiver alguma informação e interesse por Cinema, saberá quem foi Scarlet O´Hara. 

A heroína de “...E o vento levou” era – e talvez continue sendo (mas não para muitos, como no passado) a personagem feminina mais famosa da história do Cinema. E foi encarnada por Vivien. Quanto à atriz, porém, reina confusão: outro dia um conhecido meu jurava que quem fazia Scarlet era...Janet Leigh. Sua memória estava parcialmente certa, mas ficou espantado quando o corrigi. Perguntou, perplexo: “Quem é essa Vivien?”

Esse esquecimento é injusto porque nunca uma atriz serviu com tanta perfeição a um personagem. 

Reza o folclore da produção que seu produtor, o megalomaníaco David O. Selznick (que, entre outros diretores, atormentava Hitchcock com sua prepotência), em busca da atriz que encarnasse a heroína do romance popularíssimo de Margaret Mitchell, fez testes com atrizes consagradas da Hollywood dos anos 30 (Bette Davis entre elas), mas as filmagens já estavam sendo iniciadas e ele não havia ainda encontrado a atriz que queria. Sem saber o que fazer, foi filmando a produção já lá pelo meio, com o espetacular incêndio de Atlanta e dublês de Scarlet e Rhett Butler atravessando as chamas com carroças (quem se lembrar do filme, lembrará da cena, certamente). Myron Selznick, seu irmão, apareceu no pandemônio das filmagens com uma mulher desconhecida pelo braço. Apresentou-a para David: “Gênio, eis sua Scarlet O´Hara...”

Vivien era apenas uma atriz inglesa que ainda não era muito conhecida na América. Estava em Hollywood acompanhando o amante, Laurence Olivier, que fora para lá filmar “Rebecca”, também para Selznick. Na Inglaterra, Vivien tinha abandonado o marido para viver com Laurence, o que não escandalizava muito os ingleses, mas, na América, era um fato que precisava ficar em segredo. Ela lera o livro de Mitchell, e, em Londres, concebera o plano mirabolante de interpretar Scarlet na tela. Estava predestinada ao papel, sem dúvida alguma. Preparada para ser um mito.


TROCANDO O CINEMA POR OLIVIER

É impossível não admirar Vivien. Não fosse pela beleza e pelo talento de atriz, teria que ser admirada pela integridade, pelo caráter independente. Teve tudo aos pés, literalmente, pois, nos anos 40, depois do sucesso esmagador de “...E o vento levou”, foi certamente a estrela de cinema mais famosa do mundo. 

Mas o Cinema não a interessava tanto quanto o Teatro. Para desespero dos fãs eternos de Scarlet, não deu muita importância à carreira cinematográfica, rejeitou um papel atrás do outro e fez, sem acreditar nele, o papel de uma bailarina que se torna prostituta no melodrama “A ponte de Waterloo” para a Metro. O filme é um anacronismo lacrimejante, mas, quando a gente o revê, revendo Vivien, acredita-se piamente naquela tragédia, porque ela era perfeita para fazer mulheres trágicas e engole todo o resto, incluindo o galã, o apenas bonito Robert Taylor.

Vivien se lixava para os filmes. Queria era representar no palco ao lado de seu homem e seu ídolo, Olivier. Com ele, realizou incontáveis interpretações de textos de Shakespeare. Admirava o amante mais que tudo no mundo.

Mas havia aí um problema, um desses cenários atormentados apenas suspeitados por trás de casais onde os dois têm grande talento: nunca se sentia inteiramente à altura dele, um narcisista implacável. E ele a invejava porque, na tela, nunca conseguiu tornar-se um mito como era no palco. Vivien se tornou um mito do cinema, ele não. Portanto, por compensação, era muito exigente em seu território: o teatro. Vivien se arrebentava para ser elogiada por ele, colocando-se numa posição de dependência obviamente neurótica. Uma relação infernal entre dois egos imensos. Eram, àquela altura, o casal de atores mais famoso do planeta.

DIVA MANÍACO-DEPRESSIVA

O que informo aqui, soube pelo livro “Vivien Leigh”, da biógrafa Anne Edwards, lançado há muito tempo (anos 80) pela Francisco Alves e encontrável, hoje em dia, apenas nos sebos. Não tem outro interesse além de ser a biografia mais acessível de Leigh que há por aí, porque Edwards é uma escritora chata e dispôs o material, que poderia ser palpitante, de maneira muito reverente e árida.

Mas a personalidade de Vivien consegue sobreviver ao livro. O caso complicado com Olivier é mais sugerido, em tudo quanto devia conter de infernal, do que relatado cuidadosamente. É possível que Olivier tenha carregado até a morte a culpa de ter atraído para si aquela mulher, que abandonou um casamento convencional sólido, com uma filha, para segui-lo nos palcos. Que fazer? Homem algum teria resistido heroicamente a ser admirado por Vivien, linda daquele jeito. Mas o pior veio depois que eles estavam há bom tempo juntos, quando ela passou a ter crises de psicose maníaco-depressiva.

O grande público mal podia suspeitar que sua eterna “Scarlet O´Hara” tinha surtos de loucura. Sempre finíssima e aristocrática, Vivien, ao “surtar”, tornava-se uma mulher debochada, histérica, que às vezes até queria se despir em público e era contida à força por amigos. Ficava agressiva, assustava os colegas de palco, se desesperava, caía em prostrações que duravam dias e, depois de ter destratado e insultado meio mundo com uma infinidade de palavrões, se arrependia e mandava flores e presentes aos ofendidos. Não bastasse isso, tinha períodos de ninfomania. Marlon Brando, que fez com ela “Uma rua chamada pecado”, sabia que ela “traçava” com freqüência os atores com os quais contracenava, traindo Olivier. Em respeito ao grande ator, conteve-se. É o que ele diz em sua autobiografia “Canções que minha mãe me ensinou”.

Até onde isso é fofóca, quem algum dia saberá? O certo foi que Vivien Leigh estaria tendo um caso também com o ator Peter Finch, com quem começou a filmar, em meados dos anos 50, no Ceilão, o filme “O caminho dos elefantes”. Teve um de seus surtos e abandonou a produção. Para substituí-la, contratou-se Elizabeth Taylor, devido à sua semelhança com ela. E o filme ajudou Liz em sua carreira de estrela dos anos 50.

Mas foi ao lado do Brando em “Uma rua chamada pecado” (triste versão brasileira para “Um bonde chamado desejo”) que Vivien fez seu segundo grande papel na tela. Curiosamente, encarnando outra dama sulista, mas certamente muito mais mórbida e neurótica. Sua Blanche Dubois é perfeita, embora quem reveja o filme hoje em dia talvez ache a interpretação muito teatral. Vivien não é “naturalista”, não é adepta de “less is more”, não procura imitar a realidade sendo displicente e à vontade. Como toda atriz que se arrisca em patamares mais elevados, parece exagerar, mas é porque está lidando com material artístico de feitura mais exigente e traz à vida, com tanta ternura e força, a personagem de Blanche, que o texto poético de Tennessee Williams nunca encontrou uma intérprete tão definitiva. Pauline Kael dizia que, ao lado da de Falconetti para a “Joana D´Arc”, de Dreyer, essa era a maior interpretação feminina existente na história do Cinema.

Depois disso, a verdade é que não há nada muito notável de Vivien na tela, e é quase certo que o público tenha se esquecido de filmes como “Profundo mar azul”, “Em Roma, na primavera”, “A nau dos insensatos”. Já estava madura, aquela mulher, não tinha mais a fantástica atração de Scarlet e mesmo, em certa medida, a de Blanche Dubois, a despeito da carga de desespero deste personagem que certamente não é tão popular quanto Scarlet.

Sem grandes sucessos no cinema em seus últimos anos, Vivien se voltou muito mais para o teatro, seu amor maior. Mas Hollywood nunca a esqueceu. Aliás, Vivien é a matriz de certo tipo de estrelas que o cinema de Hollywood sempre procurou e consagrou: a mulher clara, mas de cabelos negros e de olhos intensamente verdes ou azuis fazendo um contraste adorável. Heddy Lamarr, Elizabeth Taylor, Jean Simmons e outras tinham acentuada semelhança com ela. Era como se Hollywood, não podendo tê-la, se empenhasse em substituí-la, até mesmo inconscientemente. Atualmente, todo mundo reconhece com naturalidade que, por trás do tipo, reina a esquecida Vivien. Haveria dificuldades para fazer uma cinebiografia, no entanto. Que atriz seria bonita e talentosa à altura dela? Não Kate Beckinsale, atriz inglesa atual que tem o tipo, mas certamente jamais encarnaria Vivien com justiça. É engraçado ver no recente “Uma semana com Marilyn”, a atriz Julia Ormond tentando encarnar Vivien com um fracasso constrangedor. Julia não é nem bonita nem talentosa o suficiente para sugerir a beleza de Vivien, que atingiu um status lendário.

Ela morreu em 1967, esquecida pelo cinema. Tinha se separado de Olivier havia muito tempo, porque o ator não tolerava mais suas crises. Cercada de admiradores, chegou a passar pelo Brasil dos 60 com a companhia teatral inglesa Old Vic.

Morreu de tuberculose, na mais clássica adequação à sua aura de heroína romântica. Com aquele rosto e aquela classe, imortalizados numa fotografia de Cecil Beaton que o livro de Edwards traz, ela foi uma diva ajustada à perfeição aos ideais de poetas e pintores. Mulheres com sua fragilidade e aura de delicadeza (sob as quais reinava uma grande turbulência) já não existem mais no cinema.

Nascera para musa. No que isso tem de mais belo, inspirador e trágico.

Chico Lopes é autor do romance "O estranho no corredor", debatido no clube de leitura em 3/5/2013


25 de setembro de 2021

estações: Everardo




colher primaveras, que ofício estranho!

(como colher se já ninguém plantou?)


nesse outono, ando mais semeador

de uns versos que não medram por igual


pretendo ainda extrair bauxita, quem

sabe aparar a chuva e viver menos como


quem colhe do que planta – uma rima

ou um sonho – no tempo desigual


28/10/2013


24 de setembro de 2021

21 de setembro - dia da árvore: Elenir Teixeira



Trazendo cor e alegria,
tem início a primavera.
Mas, com barriga vazia,

senti-la, o povo, é quimera! 🌹🌻🌺




Caros amigos ela merece que comemoremos o seu dia. Para vocês, meu haicai:

Sua sombra me acolhe.
Os seus frutos me alimentam.
Salve seu dia, Árvore! 🌳

Somos gratos à árvore
que nos traz a sombra, os frutos,
o oxigênio e vida.


Se és bem capaz de sentir
e amar o afago
 das árvores,
 pois, pertencendo ao Universo,
tu as abraças como irmãs:

Isto é Fraternidade!






Sempre tive muita intimidade com as árvores do meu quintal: Goiabeiras, mangueiras,  laranjeiras, cajazeiros, sapotizeiros, caramboleiras, limoeiros... Hoje, só as vejo nas ruas, parques, fotos, em viagens...Já não há quintais! 


Lembro do meu netinho, aos 3 ou 4 anos, me chamando da varanda do décimo segundo andar, onde morava:"Vem cá ver vovó, folhinhas verdes dançando. Elas tão escutando música?" Eu respondi: Estão, o vento canta e elas dançam.

Beijos primaveris.



Dica de leitura: A vida secreta das árvores




23 de setembro de 2021

Eu Menina Toda Prosa... e Alguma Poesia: Ilnéa País de Miranda


Araruama

‎"Havia só a menina

De corpo livre de tudo,
De alma livre de mágoa
Marcando os pés pequeninos
Em sua areia salgada.
 Molhando o azul do vestido
No respingo verde da água ."
Ilnea Pais de Miranda, escritora de nossa leitura atual.

Parabéns à sensibilidade da menina que sobreviveu e circula entre nós, orgulho do CLIc.
Elô

* * *



Opinião dos Leitores do CLIc

* * *

Para Ilnea,

Eu menina, toda prosa
já falava de poesia
mas pensa? nem sabia
como uma flor, uma rosa

ia levando a vida apenas
aprendendo a ser sozinha
me alfabetizava euzinha
sem escola que valesse à pena

a professora, mamma mia
nem sempre deu muito carinho
mas ajudou no meu caminho

hoje, sigo ainda menina,
trovando minha vida inteira
salve a poesia, minha companheira.


Rita Magnago
 Lançamento do livro TRAVESSIA DO VERSO em 25/09/2012, terça-feira
Teatro Municipal de Niterói, sala Carlos Couto, às 20h
(em frente ao Plaza Shopping)



Rita Magnago, carioca residente em Maricá, é frequentadora assídua do Clube de Leitura Icaraí (CLIc), que se reúne na Livraria da EdUFF mensalmente. Segundo Carlos Rosa, é uma “poetisa de versos claros nos quais percebemos reflexões maduras, plenas de poesia”. A autora é jornalista e, além de poesia, publica contos e crônicas. Travessia do Verso traz poemas que falam das nossas travessias pessoais.
 
* * *

A Autora do mês e a fundadora do CLIc

Ilnéa,

Obrigada por me "trazer" menina.

Obrigada por minhas lágrimas de recordações...
 
Ler você, em alguns momentos, foi como reviver um pouquinho de minha infância.

Também tive um tio muito querido, considerado por muitos meio "diferente" mas que nutria por mim um carinho puro e que me fez, muitas vezes, me sentir "especial". 
 
Um dia, para desespero de minha avó (eles moravam num sítio) ele me levou para um passeio "logo alí" de moto, que durou umas 3 horas! Passamos na estrada no meio de uma boiada! Pior, descobri que quem levava a boiada era um amigo da escola! Isso tudo para tomar caldo de cana dentro de uma lata amassada numa USINA em Tanguá. No caminho ele parava numas espeluncas no meio da estrada para comermos bolos... Eu, de cara suja de poeira de barro, ainda tinha que escutar que havia sido "achada" num latão ou coisa parecida!
 
Se fiquei triste? Que nada! Tudo parecia irreal, uma aventura, um sonho, que terminou quando voltamos ao cair da tarde e minha avó estava aflita no portão!

Tantas aprontei Ilnéa, fui bem arteira, moleca mesmo.

Vera Schubnell
* * *





Gosto de olhar comprido, longo, longe. Gosto de ver o horizonte para além do mar e de olhar desde o topo da montanha, gosto de olhar para além do fundo do céu, da liberdade de sonhar para além da imaginação, para além do já sabido, do conhecido. Gosto de conhecer, mais que de reconhecer. Para além da lenda. Assim sou eu: para além da história, ou “para lá de antes que seja história.




Troco alhos por bugalhos
naquilo que o povo assunta
troco as cartas e os baralhos
e continuo "bestunta".
Escrever o que não digo,
vezes há que me proponho,
mas estando a sós comigo...
adormeço... enquanto sonho.
 Bem pequena, eu menina,
na menina que ainda sou,
cada vez mais pequenina
enquanto o tempo... passou.
 
 
Detrás de tudo, a quietude,
dia, noite... madrugada
no silêncio, um alaúde...
escuto... não ouço nada. 

Sol de Primavera

22 de setembro de 2021

Haicais e um poema para saudar a Primavera: Elenir Teixeira


Chega a primavera...
Cinza, com chuva, sem flores...
Silêncio...Vazio...


Setembro chegando...
vem trazendo a primavera,
com flores e cores




Chega a primavera!
Cores, aromas e flores.
Só minha alma inverna.




Por todos tão esperada
ei-la que chega sorrindo!
Trazendo cor e alegria
com muitas flores se abrindo.

Nos ramos brincam os pássaros
as crianças brincam no jardim.
O mundo fica mais belo.
Que bom fora sempre assim!

A brisa fica mais doce
e doce é o perfume do ar.
Os que brigam fazem pazes,
pois é tempo de se amar.

Não! Não pensem que isto é sonho,
que se trata de quimera.
Estamos, hoje, saudando
a querida PRIMAVERA!




21 de setembro de 2021

Meu Dom Quixote

 

 



Meu Dom Quixote(*)

Carlos Benites

Recebi bem cedo pelo Correio um Dom Quixote, que esperava há várias semanas. O atraso era decorrente da pandemia. O romance de Cervantes era um sonho de consumo que carregava há muitos anos. Comprei uma edição de 1940, de quase oitocentas páginas, do  sebo de um amigo livreiro de Recife.  Aberta a embalagem, ainda meio sonolento, além da bem cuidada capa vermelha, uma longa dedicatória na folha de rosto me chamou a atenção.

Rui. Quando neste fixares o seu olhar, lembrarás que a instrução é a mais sublime arma que o homem dispõe na terra. E para te aperfeiçoares, ofereço-te uma obra escrita pelo ídolo da juventude culta, esperando que sirva de marco inicial de uma preciosa existência.    Seu tio Antonio, 10-12-43

Na página seguinte, havia uma assinatura: Rui Lopes de Castilho.

Eu sempre tive paixão por dedicatórias e anotações em livros antigos. Adoro imaginar as histórias que o dono do livro teria vivido. Nesse caso, seriam duas histórias, do tio e do sobrinho. Ajeitei a almofada na poltrona e nela encostei a cabeça. Peguei o celular e visitei o sítio da Hemeroteca da Biblioteca Nacional para pesquisar nos periódicos antigos se havia alguma notícia sobre os personagens daquela dedicatória.

Os sobrenomes não eram tão comuns. Haveria homônimos? Se fizeram algo notável, poderiam ter estampado alguma notícia. Seria o tio um advogado famoso? Seria o sobrinho um médico que salvou vidas no incêndio do circo de Niterói?

O primeiro dado encontrado datava de 1950, infelizmente no Obituário. Antonio Lopes de Castilho, amado pai e avô. Foi um baque. Seria o tio? Ficaria sem saber sobre ele. Continuei. E, na busca, um ano depois, O Fluminense noticiou matéria com o título “Duplo atropelamento na capital fluminense”. Temi em ler a notícia, mas tomei coragem:

O automóvel dirigido por Ari Correia, de 23 anos, morador de Santa Rosa, trafegava em desabalada carreira pela Avenida Amaral Peixoto, quando nas proximidades do edifício do Polícia, atropelou a senhora Alda Torres, de 49 anos, que veio a falecer no local. Na ânsia de fugir, o motorista atropelou o jovem Rui Lopes Castilho, solteiro, 21 anos, que caminhava distraído com um livro na mão. Após colidir com um poste, Ari foi cercado por populares e algemado por policiais, que chegaram em segundos e evitaram o linchamento do motorista. O jovem Rui foi socorrido e levado ao Hospital São João e está salvo. Ao “Fluminense”, contou sobre o susto que tomou, mas confia na recuperação. Disse ainda da tristeza de perder o livro que carregava. 'Presente de um tio'.”


# # # # #


(*) O presente conto foi selecionado entre os finalistas na categoria "Contos" do Prêmio Off Flip de 2021. Esta versão é a primeira. A versão que enviei para o concurso e que saiu publicada na coletânea, sofreu pequenas modificações, para atender as exigências de formatação do concurso.

Sabedoria literária



Professora lança série virtual no Youtube sobre os grandes clássicos da Literatura




16 de setembro de 2021

A tomada de Caiena

Por Wagner Medeiros Junior


A intenção francesa de conquistar um território em domínio português na América, entre a metade do século XVI e início do XVII, foi gradativamente malogrando. Entretanto, nada detinha o contrabando gaulês dos produtos naturais, que se encontrava em abundância na imensa costa do Atlântico, até então povoada quase que exclusivamente pelos nativos. Os pontos da colonização eram ainda muito esparsos e longínquos, mas os portugueses mantinham a primazia na defesa da costa.
Determinados, os franceses acabam por se fixar na ilha de Caiena, em território pertencente à Espanha. A manutenção de Caiena, contudo, não seria tarefa fácil. Além das dificuldades naturais, no período da União Ibérica os franceses deparam com a defesa portuguesa. Depois, Caiena é apoderada por holandeses e ingleses, o que obriga a coroa da França a travar uma incessante luta para retomar a colônia. Este período irá de 1656 até a conquista definitiva em 1676.
Os portugueses, aproveitando-se da União Ibérica, haviam ocupado estrategicamente a foz da bacia do Amazonas, fixando um forte na capitania do Grão-Pará e delimitando o rio Oiapoque (ou Vicente Pinzón) como fronteira com a atual Guiana Francesa. A França, por sua vez, julgava-se com direito a uma área até o rio Amazonas, parte do atual Amapá. Essa área passa a ser uma região de litígio, até que o Tratado de Utrecht, assinado em abril de 1713, garantisse a soberania portuguesa sobre ela. Mas a França continuava a não respeitar tal tratado.
Com a invasão de Portugal pelas tropas napoleônicas e a migração da família real para o Brasil, em 10 de junho de 1808 o príncipe herdeiro declara guerra à França. Logo após, decreta que “por mar e por terra se lhes fação (sic) todas as possíveis hostilidades”, determinando como revide a conquista da Guiana Francesa, a partir da tomada de Caiena, conforme planejado com a Inglaterra, em Londres.
Coube ao governador do Grão-Pará, José Narciso de Magalhães de Menezes, o cumprimento da missão. De pronto, o governador reúne a força militar da capitania e mobiliza comerciantes locais para o custeio da campanha. O comando das tropas e da pequena força naval é dado ao Tenente-Coronel Manuel Marques, que parte do Grão-Pará com o objetivo de ocupar as margens do rio Oiapoque e restabelecer a soberania portuguesa até os limites do Tratado de Utrecht. Em 15 de novembro de 1808, por fim, é dada a ordem de ataque, que chega ao comando das tropas no mês de dezembro. Nesse mesmo mês chega do Rio de Janeiro o reforço da Brigada Real da Marinha Portuguesa e o apoio da Marinha da Inglaterra, através de três de navios de guerra: Os brigues portugueses Voador e Infante Dom Pedro e a fragata inglesa Confiance.
A tomada de Caiena acontece em 12 de janeiro de 1809, cinco dias depois do desembarque. Nesse dia o governador da colônia, Victor Hugues, assina a Ata de Capitulação, que lhe valeria a prisão perpétua na França, por “imprevidência e frouxidão na organização da defesa e na operação militar”. Vários fortes haviam sido capturados e as tropas em terra feitas prisioneiras.
A administração provisória da Guiana permanece sob o comando do comandante Manuel Marques até março de 1810, quando em seu lugar é nomeado o desembargador João Severiano Manuel da Costa, que realiza uma gestão exemplar, reconhecida inclusive pelos franceses. Todavia, com a queda de Napoleão Bonaparte, em 1815, e os termos da paz do Congresso de Viena, D. João concorda em devolver o domínio da Guiana à França.
Porém, a devolução, nos termos do Congresso de Viena, só é efetivada em 21 de novembro de 1817, depois que D. João VI teve a certeza de que a França respeitaria a fronteira no Oiapoque.

Visite o blog: 

Preto no Branco por Wagner Medeiros Junior

14 de setembro de 2021

LEREIAS - O EXÉRCITO DE CAVALARIA: Edmar Monteiro Filho



Umberto Eco afirma que todo escritor cria seu texto imaginando um leitor em especial, aquele que possui informações tais que lhe permitam aceitar as premissas impostas, deixando-se conduzir pelo caminho indicado. Segundo Eco, Alexandre Dumas, em “Os Três Mosqueteiros”, descreve um trajeto percorrido pelo personagem D’Artagnan através de Paris, de tal forma que, de posse de um mapa de época, é possível acompanhar passo a passo seu itinerário. Mas ressalta que, num certo instante, Dumas comete um erro, citando uma rua inexistente no momento histórico retratado no romance. É de se supor que tenha cometido um deslize perdoável. Mas, que dizer se, no mesmo livro, D’Artagnan fosse descrito entrando em uma taberna e se deparando com Cristóvão Colombo? 

O enredo de “Os três mosqueteiros” pede que o leitor ignore um possível deslize quanto ao traçado das ruas de Paris, mas perderia toda a sua credibilidade caso descrevesse o encontro de um aspirante a mosqueteiro com o navegador genovês, nascido dois séculos antes. Dumas situa a trama do livro num momento histórico identificável, povoando-o de personagens cuja existência pode ser comprovada documentalmente, como o cardeal Richelieu e lorde Buckingham. Contracenando com estes, Athos, Porthos, Aramis e outros tantos saídos da sua imaginação. 

Assim, numa obra de ficção, o autor estabelece implicitamente os limites que entende aceitáveis para sua criação, um espaço dentro do qual sua imaginação se movimenta. Mas quando se trata de usar explicitamente as memórias pessoais na criação ficcional, a questão se complica. 

Graciliano Ramos escreve “Infância”, livro de memórias, anos depois do lançamento de “Angústia”, texto ficcional. Pelas páginas do primeiro desfilam personagens extraídos das lembranças infantis do autor. No segundo, personagens fictícios surgem revestidos com as características daqueles surgidos de sua memória. Por fim, em “Memórias do Cárcere”, Graciliano afirma que indivíduos que compartilham seu calvário durante o período em que amargou os cárceres getulistas são personagens que criou em “Caetés” ou no próprio “Angústia”, embaralhando definitivamente as referências. 

Processo semelhante ocorre com relação aos contos do escritor russo Isaac Babel. 

Babel lutou pelo exército vermelho após a revolução de 1917, assim como o protagonista das narrativas reunidas em “O Exército de Cavalaria”. Também como ele, Babel era judeu e combateu ao lado de regimentos de cossacos, conhecidos por seu orgulho, por serem excelentes cavaleiros e por seu ancestral anti-semitismo. Babel, além de intelectual, judeu, carregava outro estigma que atraía para si o ódio de seus camaradas de farda: usava óculos. Seu prestígio literário atingiu o auge com a publicação de “O Exército de Cavalaria”, em 1932, mas o escritor cairia em desgraça durante os expurgos stalinistas de 1937 e acabaria preso, morrendo em um campo de prisioneiros em 1941, provavelmente fuzilado. 

A biografia do escritor registra os fatos acima. Seus contos narram as experiências de um soldado durante a campanha russa na Polônia. Em “A Morte de Dolguchov”, um dos grandes contos do autor, é descrita a revolta de um comandante cossaco contra outro, incapaz de pôr fim ao sofrimento de um camarada que agoniza. Em “O Peru”, o narrador tem que usar de violência contra uma velha camponesa para adquirir o respeito dos comandados que o desprezam. No belíssimo “Gedali”, Babel narra a experiência de um soldado judeu, perdido entre os dogmas da Internacional Comunista e os apelos ancestrais de sua religião. Até que ponto é possível separar esses relatos ficcionais das reminiscências do escritor? Ou antes: Por que fazê-lo? 

Nos contos de Babel, as cenas de violência descritas com a crueza de um balé mórbido, os dramas da indiferença diante do sofrimento e da desgraça, narrados “com uma poesia raramente vista em textos em prosa”, e as raras fugas à objetividade crua, que brotam com a intensidade de confissões, coroam-se com imagens que o crítico Lionel Trilling chama de “epifanias”. O dicionário Aurélio define epifania como: “manifestação ou percepção da natureza ou do significado essencial de uma coisa”. Assim, o escritor parece mergulhar em suas memórias para extrair delas um feixe de revelações, coroando os acontecimentos com uma luminosa compreensão sobre as vidas de seres sujeitos aos extremos da dor. Nesse sentido, ocioso distinguir o quanto de ficção e de fatos reais compõem os contos de “O Exército de Cavalaria”, textos mergulhados na força de sua própria verdade.

BABEL, Isaac. O Exército de Cavalaria. São Paulo: Cosac Naify, 2006, 259 p.

2 de setembro de 2021

Poemas e Haicais: Claudia & Elenir & Inês & Vera


As azaleias da nossa casa,
Quando florescem, são generosas,
Abrem todas de uma vez.
São vaidosas.
Me obrigam a contemplá-las,
Mas isso me dá prazer.
Vão embora devagarinho
Para que possamos nos despedir.
Já alegraram nossos olhos,
Enfeitando nosso jardim ...
Agora se recolhem,
Colorindo nosso chão.

(Vera)



Em flor

Hoje no meu caminho cheio de distâncias
Deparei -me com um ipê florido
Atingida pela beleza
De repente,
Era seiva que fluía nas copas
Minha alma encheu-se de perfume
Algo em mim desabrochou.
Hoje, toda rosa
Estou toda em flor
O pálido se foi
Num calor muito bonito
Chegou a primavera em mim.

Inês  Drummond.
(Membro da Academia Niteroiense de Letras)
   (Do livro : Dentro das palavras.)
(Que será tema do Debate de Confraternização de Fim de Ano no CLIc)




À beira da estrada,
ipês roxos e amarelos,
o caminho enfeitam.

É chegada a primavera
trazendo flor, alegria,
e, muita luz, eu quisera,
pra curar a pandemia.

(Elenir)





Hoje de manhã
acordei contando versos.
Haicais matutinos.

Uma garça branca
observa os peixes do lago,
Altiva e elegante.

A metamorfose
da lagarta em borboleta.
Milagre sutil.

(Claudia)






À beira do lago, 
duas estátuas brancas: 
garças se aquecendo.

(Elenir)


1 de setembro de 2021

Minhas relíquias natalinas: Vera Schubnell

É tradição.

Há mais de 30 anos fazemos o Natal em nossa casa, sempre no dia 25, onde comemoramos com um almoço informal. A família surge de todos os lados, As vezes de: Floripa, Porto Alegre,  Alemanha,  Itália, Estados Unidos...Tudo depende. Quem chega é sempre bem vindo! As "línguas" se atropelam, mas a alegria do aconchego supera todos os idiomas!

Fulano está demorando com a salada, quem vai trazer a sobremesa?

As crianças, donas da festa, pulam na piscina para a farra com os primos.

Coisas de um Natal tropical, sem neve e com muito calor. Calor humano sobretudo!

Na garagem o pingue pongue corre solto!

A casa acorda cedinho para abraçar os parentes e amigos. É um corre corre só! Coloca o gelo na sombra! Varre o quintal! Junta as mesas! Arruma a varanda! UFA! Todo ano a mesma correria, mas todo ano a mesma alegria!

Papai Noel é imperdível, quem será o "sortudo" que vai ser escolhido para entrar naquela roupa "invernal"...Ventiladores são colocados estrategicamente ao lado de sua cadeira de balanço ( que pertenceu ao meu sogro que faleceu com 106 anos) que agora mora com suas lembranças, em nossa casa.

Depois do almoço, algumas vezes com palavras de agradecimentos e recordações, chega a hora esperada pelas crianças!

Papai Noel desce as escadas com seu sino. Os mais pequenos, ainda inocentemente, olham encantados. Os maiores tentando descobrir o "sortudo do ano",  minha irmã, animadíssima, puxa a música e as palmas.

Euforia geral !

Cada criança chamada, um beijo... Os adultos fazendo piadinhas com a barba que está caindo, a barriga que vai descendo, os óculos que entortaram...

Cata papel daqui e dali, arrumação na varanda antes da saída. Alguns ficam para um papo e arrematar as sobras...

Num cantinho da casa, todos os anos encontramos, sutilmente deixado, um cartão de Natal de minha cunhada com palavras de agradecimento...Talvez ela não saiba, mas estão todos guardados!

Natais memoráveis!

Este ano estamos meio "murchos", não seremos tantos, muitos estarão viajando. Sentiremos falta desse "tumulto familiar".

Talvez essa saudade tenha me feito dividir um pouquinho minhas lembranças, quem sabe seja a forma que encontrei de estar com todos vocês presentes !

Um Natal de sonhos, agradecimentos e paz interior, AMIGOS!

Beijos ternos e sempre cheios de esperança,



Vera participou do Clube de Leitura Icaraí de Novembro de 2011 a 2021.