Carlos Rosa Moreira |
No restaurante da sobreloja do shopping, o movimento não era
grande. Apenas algumas mesas estavam ocupadas naquele canto do
corredor. Por isto, foi o ponto escolhido para o reencontro.
‒ Nós não devíamos estar aqui ‒ disse ela.
‒ Por que não? O que tem se nos virem? Somos dois amigos que se
encontraram casualmente na hora do almoço.
‒ Muita gente nos conhece, e ele morre de ciúme de você.
‒ E eu tenho muito mais do que ciúmes; tenho uma saudade infinita
de nós dois.
‒ Se fosse verdade, teria ficado comigo.
‒ Já conversamos tantas vezes sobre isso...
‒ É, você não quis deixar sua família, prefere “ser infeliz
dentro de casa”. Sabe de uma coisa? Você não é infeliz, muito
pelo contrário, gosta da vida que tem.
‒ Eu não quis arriscar a paz e a felicidade dos meus filhos. Você
é que não teve paciência para esperar.
‒ Esperar... Até seus filhos ficarem independentes? Acha que
nasci pra amante?
‒ Nunca pensei em fazer de você minha amante. Eu me envolvi
seriamente. Mas nós só provávamos o lado adocicado da vida; eram
passeios, jantares, tardes maravilhosas e a cama desprovida de
amarguras, cobranças e preocupações. Não sabemos como poderia ser
o dia a dia: você nunca me viu acordar e eu não conheço suas
manias.
‒ Quem ama não pensa nisso.
‒ Olhe, não foi por isso que a chamei, já discutimos tanto sobre
esse assunto...
Eu quero dar uma coisa a você.
‒ É? Finalmente.
‒ Você me ajudou muito. Naquela época de horror, se não fosse
você, não sei o que teria acontecido.
‒ Fui uma boa amante, não?
‒ Não, foi minha amiga, meu amor. Não consegue entender, não é?
‒ Claro que não. Se eu era o seu amor, como pôde ficar com ela?
‒ É a minha família! Não entende?
‒ Não!
‒ Não adianta essa conversa. Você me ajudou, conseguiu aquele
emprego com seu pai quando eu já tinha perdido tudo, foi o que me
salvou.
‒ Não poderia imaginar que estava ajudando sua mulher... Ela
deveria me agradecer, sabia?
‒ Isso não interessa, o que interessa é que eu ganhei as ações
na justiça e recuperei tudo. Foi por isto que a chamei. Lembra-se de
quando recebi o primeiro ordenado no emprego com seu pai? Você
disse: Quero um presente! Pois aqui está.
Ele escorregou a mão fechada sobre a toalha da mesa e colocou algo
na mão dela.
‒ O que é isso, um cheque? É um cheque! Dez mil reais! Você
está me dando essa grana?
‒ Estou. E se pudesse daria mais, você merece tudo.
‒ Não sei o que dizer... estou boba ‒ disse ela enquanto
admirava o cheque esticado entre os dedos.
‒ Compre um carro, viaje, mesmo com aquele chato, ficarei feliz
por você.
‒ Meu Deus...
‒ Morro de saudade de você...
Ele entrelaçou seus dedos aos dela. Ela olhou as mãos unidas e
acariciou, com o polegar, o dorso da mão dele.
‒ Eu também sinto...
‒ Vamos ficar juntos, uma vez que seja, agora!
‒ Não, eu não posso fazer isso. Faz dois anos que estou casada,
e você tem a sua mulherzinha.
‒ Nada tem a ver com eles. Antes do seu marido nós já
existíamos, e quando você o namorava ainda estávamos juntos. Temos
nossa relação no tempo, é uma coisa que pertence a nós!
‒ Vocês homens são engraçados... Para mim isso se chama
traição!
Ela se desvencilhou da mão dele.
‒ Eu estava casado e fiquei com você, por que agora não fica
comigo? Isso se chama falta de amor!
‒ Gostaria que sua mulher o traísse?
‒ Lembra-se dos nossos momentos, nossas brincadeiras? Era tão
bom... Lembra quando te paguei?
Ele sorriu, esticou o braço e pegou a mão dela. Ela também
sorriu, olhando-o carinhosamente de baixo para cima.
‒ Lembro... até isso eu fiz.
‒ Estava linda naquele vestido vermelho: as unhas pintadas, o
batom carmim...
‒ E era. Era a minha puta.
Ela sorria parecendo envergonhada, desenhava na toalha com a unha.
‒ O que a gente não faz... Cento e cinquenta reais pra ser
puta...
Ele não respondeu, perdeu-se na face dela. Deixou-se transportar
para o quarto de motel, sempre o mesmo nos seus encontros. Ela estava
deitada de bruços completamente nua. As três notas de cinquenta
dobradinhas sobre a mesinha. Beijou-a dos dedos dos pés aos cabelos.
Percorreu com a ponta da língua as pétalas úmidas, desabrochadas,
tocando-a no ponto mais sensível para que explodisse num gozo louco.
Ele se viu em riste, admirando as pernas longas afastadas, deixando
entrever os pêlos castanho-claros. Ela esticou os braços para trás
e, com as pontas dos dedos, abriu as nádegas alvas e arredondadas
oferecendo-lhe o que tanto desejava. O contraste das unhas longas,
vermelhas, com a brancura da pele, as carnes íntimas, tão róseas,
o oferecimento...
‒ Daria qualquer coisa para ter de novo aquele instante. Vamos
ficar juntos agora, por que não? Eu sei que você quer...
Ela abaixou os olhos e movimentou negativamente a cabeça.
‒ Eu pago qualquer coisa. Por favor, mostre que é verdade quando
dizia que me amava, eu preciso ter certeza!
‒ Paga?
‒ Pago. Pago dez mil!
‒ Mais dez?
‒ Isso. Eu amo você de verdade, quero vê-la feliz, nunca vou
deixar de amá-la.
Ela olhou para ele, depois se virou e olhou à volta, puxou os
cabelos loiros para trás com as duas mãos, prendendo-os com um
estilete de madeira trabalhada. Apertou a mão dele que jazia sobre a
mesa.
‒ Vamos, disse ela.
Conheça mais sobre a leitora CLIc Maria Teresinha que indicou este Conto de Carlos Rosa