O
Debate foi realizado pelo ZOOM
Data:
11 de maio 19:30 h - Icaraí
O
tempo máximo de uma reunião pelo Zoom é de cerca de 40 minutos e, por isso, foi
necessário abrir uma segunda sessão para continuarmos a Reunião.
Dezessete pessoas
acessaram o aplicativo durante as duas sessões que realizamos, algumas (7)
(Amanda, Rose, Eduardo II, Benito, Lúcia, Solange e Nair) apenas na primeira
sessão. Benito teve problema com o microfone, mas escutou toda a sessão,
fazendo comentários pra mim posteriormente. Nair acessou a plataforma, mas não
pode ficar e saiu em seguida. Disse-me que na próxima ela fica. Na
segunda parte da reunião entraram 6 novos participantes: Eduardo Leite, Renata,
Ceci, Adriana, Benites e Joana. Participaram de ambas as sessões 4
leitores / leitoras: Silvana, Elenir, Eloisa e Evandro.
O autor, José J.
Veiga, é considerado um dos maiores autores em língua portuguesa do realismo
fantástico e talvez por essa razão tenha surgido uma interpretação do conto
interessante, feita pela Solange, de que os irmãos se tratavam, na verdade, de
apenas uma pessoa, um Doppelgänger, que se encontrava consigo mesmo ao
retornar à casa materna 17 anos depois de estar solto no mundo, sem contato nem
notícia. Foram levantadas algumas objeções quanto a esta interpretação.
Eloisa, por exemplo,
não viu realismo mágico no texto. Discordou da ideia de ser um só adulto
se olhando mais jovem. Para ela, o texto trata da incapacidade de comunicação,
após tantos anos, entre dois irmãos. Há um desconhecimento de
ambas as partes. O encontro se torna um suplício pela falta de intimidade.
O narrador acha haver intromissão do mais novo na família, inicialmente. Mas,
ao final, conclui "O intruso sou eu, não ele". Entre eles há um
diálogo vazio, coisas superficiais, quebrado com a chegada da vizinha,
quebrando a tensão íntima do narrador e, possivelmente, do caçula.
Finalmente poderão agir: buscar um padre para a mãe doente. Esse conto mostra
não bastar a consanguinidade, que relações fraternas requerem intimidade
para construção de amor, do amor fraterno. Amor não é mera convenção.
Eloisa disse que viveu essa experiência ao conhecer dois irmãos, “filhos
de meu pai com outra mulher. Tentamos, mas não deu. Só eu
falava, tentava...Quando os conheci, eu já tinha meus 25, 26 anos. Eles
eram muito tímidos, dois adolescentes.” Na Reunião, o conto com o qual
quis associar o diálogo vazio do texto foi Missa do galo, quando Conceição percebe
que não ia alcançar seu objetivo. Começa a olhar gravuras, falar de coisas
triviais… assim como o narrador deste conto, que fica olhando sapatos do irmão,
roupa. Essas observações feitas pelo narrador sobre a roupa e sapatos do rapaz
poderia ser uma evidência da objetividade do encontro. É comum, em situações
de certa tensão, nosso olhar se fixar em detalhes exteriores do
ambiente...gravuras, rachaduras, pinturas etc. Nosso pensamento vagueia. Eloisa concluiu dizendo: "o conto tem me levado a recordar muitas coisas do passado. Que vida cheia de eventos familiares complexos, foi a minha."
Benito, ao se contatar
comigo posteriormente, embora tenha achado interessante a interpretação, releu
o conto mais de uma vez para encontrar evidências da mesma mas acabou achando
uma que a contesta: em certa parte o narrador, que vive em hotéis, diz
que nunca pensou em ter um cão o que, segundo o rapaz, era algo impeditivo para
ele querer viver num hotel, mesmo que fosse de graça, porque nesse caso ele não
poderia ter um cão como companhia. A interpretação, segundo ele, só faria
sentido se se tratasse de um personagem esquizofrênico. Se a interpretação de
Solange fosse ou for possível, salvaria ou salva o conto de um
problema de foco narrativo: um narrador em primeira pessoa parece onisciente,
sabe o que se passa na cabeça de seu presente ou imaginário interlocutor.
Elenir, no entanto,
concordou com Solange porque lhe pareceu que fosse como um sonho. Quando o
narrador entrou na sala era como se ele se visse. O rapaz estava com a mesma
idade que ele tinha quando saiu de casa. Então ele estava se vendo quando saiu,
as dúvidas que tinha, o que a mãe lhe dizia, o sapato surrado que ele usava.
Ele estava lembrando, então não deixa de ser o realismo mágico. Na hora que a
vizinha veio lhe falar ele despertou.
Silvana relatou uma
experiência similar que teve ao encontrar um irmão numa situação em família que
também a constrangeu bastante. A figura de um estranho-irmão é algo muito forte
em nossa vida e a intensidade dos sentimentos dependerá muito da história
pessoal de cada um. Às vezes a relação entre irmãos que se conhecem desde
sempre já pode ser algo complicado imaginem a descoberta da existência de um
irmão que trouxesse consigo toda uma história que não fosse bem digerida.
Rose adorou o conto. E
se surpreendeu como, com tão poucas linhas, o autor conseguiu dizer tanto.
Embora tenha gostado dos relatos, não viu menção quanto à "qualidade"
ou à apreciação dos leitores. Ela acha importante que se destaque isso.
Ceci achou bem
interessante como diante de um texto (como de qualquer outra coisa) as pessoas
interpretam de várias maneiras, cada uma, quem sabe, por conta das projeções e
vivências. Por ser uma profissional que lida com o subjetivo, gosta muito
dessa discussão solta, sem a preocupação de dar um sentido final… Assim
torna-se mais rica do que se fechar em conceitos, o que empobrece o pensar. Ela
também sentiu na leitura do Conto como se fosse um retorno à infância, num
momento dramático (só se tem essa informação no final do conto), de uma pessoa
que teve de se distanciar desse cenário e criar um corte...Vê como nesse
retorno, a volta às memórias do passado, da criança que foi.
Há uma tensão
psicológica constante nesse encontro e o narrador passa de um constrangimento
de considerar o irmão mais novo um intruso para uma situação em que ele se
sente o intruso. Um martírio mútuo. Ambos esperam que algo aconteça para se
salvarem do franco desespero. O narrador chega desejar que alguma catástrofe
ocorra para justificar o fato de ele sair correndo daquele lugar, O que os
salva da câmara de suplício em que se sentem é a entrada abrupta da vizinha na
sala dizendo apreensivamente que a mãe deles está pedindo um padre. Mãe de
quem? Do narrador? Do rapaz? De ambos? Para quê? Para quem? Por quê? Os dois
deram graças a Deus? Bem, a história agora fica por conta do Leitor!
Próximas Reuniões:
25/05/2020 19:30h
Mia Couto
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indicado por Rita
|
08/06/2020 19:30h
Jorge Luis Borges
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indicado por Adriana Marins
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Queria entender mais dessa linguagem e interpretações literárias... Benito:por que é que se a interpretação da Solange ( acho interessante) fosse possível, "salvaria o conto de um problema do foco narrativo...um narrador em primeira pessoa onisciente....." ??? (Ceci)
ResponderExcluirEsse negócio de ter de abrir espaço para o outro na vida da gente é incômodo demais. Ninguém deveria ser obrigado a nada. As pessoas devem ser autênticas. As situações impostas agridem, elas deveriam acontecer naturalmente quando alcançar a maturidade. Deve ser por isso que os rapazes estavam loucos para que aquele encontro acabasse logo e o constrangimento também. Não estava no tempo certo nem a hora era propícia. A mãe enferma era uma imposição desse encontro de seres desconhecidos e diferentes, embora irmãos. Não basta o mesmo sangue correr nas veias, é preciso afinidades. E isso só o tempo poderia proporcionar.
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