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15 de fevereiro de 2020

Preocupações um tanto esquizofrênicas de um engenheiro metido a filósofo

Emmanuel Paiva de Andrade 

A revista Piauí deste mês (Fevereiro de 2020) trouxe uma matéria extensa (12 páginas tamanho tabloide) sobre o dono da Amazon, Jeff Bezos. O título da matéria é "O grande plano: os métodos de Jeff Bezos, o dono da Amazon, para fazer o mundo aceitar os seus valores", escrito por Franklin Foer. 

Mergulhei na matéria com o sentimento de amor e ódio que tenho por esse personagem, sobre quem já li bastante coisa, inclusive na disciplina "Economia e Gestão da Inovação", que ofereço para a graduação em Engenharia de Produção. Um marco dessas leituras na disciplina foi o livro "Os Quatro: Apple, Amazon, Facebook e Google. O Segredo dos Gigantes da Tecnologia", de Scott Galloway. 

A razão do meu amor e ódio é que, se por um lado, sou um consumidor compulsivo do produto por excelência sobre o qual se erigiu o império Amazon, e adoro a eficiência com que ela faz chegar até minha casa meu último objeto do desejo, por outro, não deixo de me entristecer ao perceber que os lugares que eu amava frequentar, como a Livraria Leonardo Da Vinci na Avenida Rio Branco e outras do mesmo estilo, estão desaparecendo.

Se por um lado, como engenheiro, sou um observador um tanto apaixonado da tecnologia e sua relação transformadora com a ciência e a sociedade, e vejo na Amazon a linha de frente do que está acontecendo nessa área e pode acontecer no mundo, por outro, vejo, com preocupação, que dimensões que durante séculos se forjaram como valores para a humanidade, como a ética, a igualdade, a democracia e a liberdade, estão subliminarmente sob ameaça com a emergência de um novo império, diferente de todos que se viram anteriormente, porque construído sobre as bases da ciência e da tecnologia.

Enfim, quando comecei a leitura, senti uma pontinha de satisfação, porque me parecia estar lendo um autor que fortalecia meu lado ódio ao personagem. Pra não ser tão radical, vou dizer que fortalecia meu lado crítico ao personagem. Mas, qual o que! Com o avanço da leitura fui vendo que estava diante de alguém que, como eu, fora capturado pelas doces contradições que o mundo da ciência e da tecnologia nos colocam, sem a mínima consideração pelo nosso romantismo e convicção de que um mundo melhor é possível. 

Que ao menos nos reste, então, a compreensão e a aceitação de que o olhar crítico talvez seja a única forma de, como diziam Nonaka e Takeuchi no seu seminal "Criação de conhecimento na empresa", conviver com o paradoxo, sem pretender eliminar um dos seus lados. Fora disso, é mergulhar na esquizofrenia nossa de cada dia.



Um comentário:

  1. Eu não sei bem como funciona a mente de um engenheiro, mas ele nos colocou com mais curiosidade no tema e leitura. Se fosse um médico iria dissecar a matéria para nós? E um psicanalista? A curiosidade persiste. Eu espero que o engenheiro continue nos provocando com os seus questionamentos e críticas.

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