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24 de fevereiro de 2019

O homem que amava os cachorros: Leonardo Padura


Uma pedra jamais o será simplesmente
enquanto a boca sedenta do eterno
ungir com seu beijo a superfície da esperança.
O gosto do calcáreo-mármore-granito
toca o fluido-semente
troca o símbolo da vida
líquido e sólido
atmosfera em simbiose.

(Rita Magnago)




"...É então que o aparecimento de uma árvore, o perfil de uma montanha, a corrente gelada de um rio ou uma simples rocha no meio da estepe se transmutam em algo de tal forma notável que se tornam objeto de veneração. Os nativos daqueles desertos longínquos glorificavam as pedras porque asseguravam que na sua capacidade de resistência se expressava  uma força, presa para sempre em seu interior, que era fruto de uma vontade eterna".  

Que busquemos em nosso interior o belo e a paz da natureza e a força e resistência da pedra. Transcrevo, a seguir, uma estrofe do meu poema Fraternidade:

                                                 Se a tua alma se enternece
                                                com o céu, a pedra e o mar,
                                                as flores e os passarinhos,
                                                pois, pertencendo ao universo
                                               tu os abraças como irmãos:
                                               Isto é Fraternidade.

Se mesmo sem conheceres
teus iguais de outras plagas
com eles te preocupas
elevando o pensamento
em prece e meditação:

isto é Fraternidade.

(Elenir)

* * *


Embora tenha tentado evitar, e tenha me agitado e negado, enquanto lia fui sentindo como era invadido pela compaixão. Mas só por Iván, só pelo meu amigo, porque ele sim a merece e muita: merece-a como todas as vítimas, como todas as trágicas criaturas cujo destino é dirigido por forças superiores que as ultrapassam e as manipulam até as transformarem em merda. Essa foi a nossa sina coletiva, e que Trotski vá para a puta que o pariu se, com seu fanatismo de obcecado e seu complexo de ser histórico, não acreditava que existissem as tragédias pessoais, mas apenas as mudanças de etapas sociais e supra-humanas. E as pessoas? Algum deles pensou alguma vez nas pessoas? Perguntaram-me, perguntaram a Iván, se concordávamos em adiar sonhos, vida e todo o resto até que se evaporassem (sonhos, vida e o raio que o parta) no cansaço histórico e na utopia pervertida?


A atriz espanhola teria visitado o assassino na prisão no México



– Se sou uma comunista defeituosa, Ramón, é por tudo isso – continuou Caridad, depois de servir um terceiro copo ao filho e de, ela própria, beber um quarto (quinto, sexto?). – Meu ódio nunca me permitirá trabalhar para construir a nova sociedade. Mas é a melhor arma para destruir esta outra sociedade, e por isso os transformei, a todos vocês, meus filhos, naquilo que são: os filhos do ódio. Amanhã, depois de amanhã, dentro de dois dias, quando estiver diante do homem que tem de matar, lembre-se de que ele é meu inimigo e também seu. De que tudo o que diz sobre a igualdade e o proletariado é pura mentira e de que a única coisa que ele quer é o poder. O poder para degradar as pessoas, para dominá-las, para fazer com que rastejem e sintam medo, para meter no cu delas, que é como mais gozam os donos do poder. E, quando você estourar a cabeça daquele filho da puta, pense que o seu braço é também o meu: estarei lá, te apoiando, e somos fortes porque o ódio é invencível. Beba esse copo, porra! Agarre o mundo pelos colhões e ponha-o de joelhos. E meta isto na cabeça: não tenha piedade, porque ninguém a terá de você. Nunca. E, quando estiver fodido, não aceite compaixão. Ninguém precisa se compadecer de você! Você é mais forte, você é invencível, você é meu filho, collons !


La societé c'est moi!

"Embora ainda não tivesse começado a acompanhar Ana à igreja, Dany, Frank e os outros poucos amigos que via diziam que eu parecia estar trabalhando para minha candidatura à beatificação e minha ascensão incorpórea aos céus. A verdade era que, lendo e escrevendo sobre como a maior utopia que alguma vez os homens tiveram ao alcance da mão fora pervertida, mergulhando nas catacumbas de uma história que mais parecia um castigo divino que obra de homens ébrios de poder, de ânsias de controle e de pretensões de transcendência histórica, tinha aprendido que a verdadeira grandeza humana está na prática da bondade incondicional, na capacidade de dar aos que nada têm não o que nos sobra, mas uma parte do pouco que temos. Dar até doer, e não fazer política nem pretender prerrogativas com essa ação, muito menos praticar a enganosa filosofia de obrigar os outros a aceitar nossos conceitos do bem e da verdade por (acreditarmos) serem os únicos possíveis e por, além disso, deverem estar agradecidos pelo que lhes demos, mesmo que não o tivessem pedido. E, embora soubesse que a minha cosmogonia era de todo impraticável (e que merda fazemos com a economia, com o dinheiro, com a propriedade, para que tudo isso funcione? e que porra fazemos com os espíritos predestinados e com os filhos da puta de nascença?), satisfazia-me pensar que talvez um dia o ser humano pudesse cultivar essa filosofia, que me parecia tão elementar, sem sofrer as dores de um parto ou os traumas da obrigatoriedade, por pura e livre escolha, por necessidade ética de ser solidário e democrático. Masturbações mentais minhas…" (p. 419)


Túmulo de Trotsky no México


“É terrível verificar que um sistema nascido para resgatar a dignidade humana tenha recorrido à recompensa, à glorificação, ao estímulo da denúncia, e que se apoie em tudo o que é humanamente vil. A náusea sobe-me pela garganta quando ouço as pessoas dizerem: fuzilaram M., fuzilaram P., fuzilaram, fuzilaram, fuzilaram. As palavras, de tanto as ouvirmos, perdem seu sentido. As pessoas repetem-nas com a maior tranquilidade, como se estivessem dizendo: vamos ao teatro. Eu, que vivi esses anos no medo e senti a compulsão de denunciar (confesso com pavor, mas sem sentimento de culpa), deixei de sentir na minha mente a brutalidade semântica do verbo fuzilar… Sinto que chegamos ao fim da justiça na Terra, ao limite da indignidade humana. Que morreram demasiadas pessoas em nome daquela que, prometeram-nos, seria uma sociedade melhor”…





Só a inocência absoluta pode salvar e, mesmo assim, muitos inocentes são capazes de confessar que mataram Cristo para que os deixem em paz e os matem o mais depressa possível. (p. 254)


Fonte: Época

"Nada mais próximo da moral comunista do que os preceitos católicos" (p. 93)

Olha, tem uma coisa muito importante que me ensinaram...: o homem é irrelevante, substituível. O indivíduo não é uma unidade excepcional, mas um conceito que se soma e forma a massa, esta sim real. Mas o homem enquanto indivíduo não é sagrado e, portanto, prescindível. Por isso arremetemos contra todas as religiões, especialmente o Cristianismo, que diz essa tolice de o homem ter sido criado à semelhança de Deus. Isso nos permite ser ímpios, desfazer-nos da compaixão que gera a piedade: o pecado não existe. Sabe o que isso significa?... É tudo a mesma merda, é nada. Nomina odiosa sunt. Importa o sonho, não o homem... (p.298)


"Ninguém escolhe o tempo de viver, morrer ou matar" (Pavel Sudoplatov)


Oración al Glorioso San Luis Beltrán

Criatura de Dios, yo té curo, ensalmo y bendigo en nombre de la Santísima Trinidad Padre, Hijo y Espíritu Santo, tres personas y una esencia verdadera; y de la Virgen María, Nuestra Señora concebida sin mancha de pecado original, Virgen antes del parto, en el parto y después del parto y por la gloriosa Santa Gertrudis, tu querida y regalada esposa, once mil vírgenes, Señor San José, San Roque y San Sebastián y por todos los Santos y Santas de tu Corte Celestial; por tu gloriosísima Encarnación, gloriosísimo Nacimiento, Santísima Pasión, gloriosísima Resurrección, Ascensión; por tan altos y Santísimos meritos que creo y con verdad; suplico a tu Divina Majestad poniendo por intercesora a tu Santísima Madre y abogada nuestra, libres, sanes a esta criatura de esta enfermedad. Amén, Jesús. No mirando a la indigna persona que refiere tan sacrosantos misterios con tan buena fé, te suplico, Señor, para más honra tuya, y devoción de los presentes, te sirvas por tu piedad y misericordia de sanar y librar de esta herida, llaga o dolor, humor, enfermedad. Y no permita tu Divina Majestad, le sobrevenga accidente, corrupción ni daño, dándole salud para que con ella te sirva y cumpla tu santísima voluntad. Amén, Jesús. Yo te curo y ensalmo y jesuscristo Nuestro Señor Redentor te sane; bendiga y haga en todo su divina voluntad. Amén. (Esta oración se hace contra todo tipo enfermedades)


Ramón é um homem de outra época, de um tempo muito fodido, quando nem sequer a dúvida era permitida... pertenceu a uma geração de crédulos por obrigação. 

Karl Marx




Leia aqui "O homem que amava os cachorros" de Leonardo Padura!


2 comentários:

  1. Evandro, obrigada pela postagem, para mim esta entrevista foi bastante esclarecedora, mesmo não concordando com algumas falas, achei de grande importância.
    Beijos ternos,
    Vera.

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  2. Olá "leitora apaixonada pelo livro"! Eis a postagem que você procurava onde consta o "vídeo com o representante da editora Boitempo + uns dois ou três jornalistas / escritores". Tem sido muito gratificante contar com sua maravilhosa participação no nosso clube de leitura. Até sexta!

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