OS BONS TEMPOS VOLTARAM
Poemas de Szymborska e Amigo Oculto comemorativo de final de ano |
O CLIC RENASCE COM A MAGIA DA POESIA
QUANDO FOI A ÚLTIMA VEZ QUE VOCÊ LEU POESIA DE VERDADE?
“o Mozart da poesia” |
- Não vais entrar - diz a pedra -
Falta a ti o sentido da participação.
Nenhum sentido substitui o sentido da participação.
Mesmo a visão elevada até à clarividência
não serve para nada sem o sentido da participação.
Não vais entrar, tens apenas uma noção deste sentido,
apenas o seu germe, sua imagem.
Bato à porta da pedra.
- Sou eu, deixa-me entrar.
Não posso esperar dois mil séculos
para entrar debaixo do teu teto.
Se não crês em mim - diz a pedra -
Dirige-te à folha, ela te dirá o mesmo que eu,
e à gota d"água, que te dirá o mesmo que a folha.
Por fim pergunta aos fios de teu próprio cabelo.
Um riso se alarga em mim, um riso, um riso enorme,
eu que não sei rir.
Bato à porta da pedra.
- Sou eu, deixa-me entrar.
- Não tenho porta - diz a pedra.
"Excesso", de Wislawa Szymborska
"Foi descoberta uma nova estrela,
o que não significa que ficou mais claro
nem que chegou algo que faltava.
A estrela é grande e longínqua,
tão longínqua que é pequena,
menor até que outras
muito menores que ela.
A estranheza não teria aqui nada de estranho
se ao menos tivéssemos tempo para ela.
A idade da estrela, a massa da estrela, a posição da estrela,
tudo isso quiçá seja suficiente
para uma tese de doutorado
e uma modesta taça de vinho
nos círculos aproximados do céu:
o astrônomo, sua mulher, os parentes e os colegas,
ambiente informal, traje casual,
predominam na conversa os temas locais
e mastiga-se amendoim.
A estrela é extraordinária,
mas isso ainda não é razão
para não beber à saúde das nossas senhoras
incomparavelmente mais próximas.
A estrela não tem consequência.
Não influi no clima, na moda, no resultado do jogo,
na mudança de governo, na renda e na crise de valores.
Não tem efeito na propaganda nem na indústria pesada.
Não tem reflexo no verniz da mesa de conferência.
Excedente em face dos dias contados da vida.
Pois o que há para perguntar,
sob quantas estrelas um homem nasce,
e sob quantas logo em seguida morre.
Nova.
- Ao menos me mostre onde ela está.
- Entre o contorno daquela nuvenzinha parda esgarçada
e aquele galhinho de acácia mais à esquerda.
- Ah, exclamo."
(Do livro Poemas de Wislawa Szymborska, tradução de Regina Przybycien, publicado pela Companhia das Letras.)
Dois Macacos: Brueghel |
A escolha de um livro de poesia para o mês de dezembro foi muito feliz. Que em 2017 façamos Boas escolhas de leitura!
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