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6 de março de 2024

À sombra das raparigas em flor: Proust




A moça que vendia leite no trem: Elô

A simplicidade, pra quem não está muito habituado com ela , encanta. Eu me lembro de que quando saí do Fonseca  pra morar sozinha em Lagoinha, ficava  encantada . No final da minha nova rua, havia um pequeno curral. Eu ia comprar leite tirado na hora,  bem cedo.  Via a enorme bola do sol ,no final da rua e sentia o cheiro do esterco. RESTOS DE UMA VIDA  mais simples, campesina. Havia também uma horta em outra rua próxima. O caminho era de terra arenosa,  não havia asfalto ainda.  Eu comia poeira, pra ir dar aula no final de Santa Isabel. Eu romantizava tudo.   Depois veio o primeiro mercado no bairro, asfalto, a horta acabou e o boi e a vaca morreram. Até o dono deles,  acho.  O asfalto chegou... Assim.  Marcel também aprecia, desde menino,  a natureza dos campos,  as pessoas mais simples.  Eu adorava ouvir as histórias de Lagoinha , através de uma senhora.  Houve mesmo uma lagoinha, uma fazenda  que fabricava o óleo das lamparinas , antes da luz elétrica,  ela contava : Fazenda do Assa - peixe. Acho que esse era o nome antigo. No quintal de minha última morada por lá, vez em quando, se encontrava restos de louças,  objetos dos escravos. Quando mexeram  no terreno pra construir novas casas ,  descobriram alguns objetos. Dona Didinha me contava essas histórias  de Lagoinha.  Depois a lagoa do lugar foi secando , haviam os valões.  Tudo passa!

"… se a imaginação é levada pelo desejo daquilo que não podemos possuir, seu impulso não é limitado por uma realidade inteiramente percebida nesses encontros, onde o encanto da passante está em geral diretamente relacionado com a rapidez da passagem ".


Convescote proustiano

21/05/2023 - 11:00 h

Local: Jardim Botânico

Banco sonoro próximo ao Lago Frei Leandro

Em busca do tempo perdido - Vol. 2 - À sombra das raparigas em flor






"(...)Voltei porque devia ir jantar em Rivebelle com Robert, e minha avó exigia que em tais dias, antes de partir, eu me estendesse uma hora no leito, sesta que o médico de Balbec logo me prescreveu para as outras tardes. Aliás, para voltar, nem sequer havia a necessidade de deixar o dique e penetrar no hotel pelo hall, isto é, por trás. Em virtude de um adiantamento comparável ao do sábado em Combray, quando se almoçava uma hora mais cedo, agora, em pleno verão, os dias se haviam tornado tão longos que o sol ainda estava alto no céu, como em uma hora de merenda, quando punham a mesa para o jantar no Grande Hotel de Balbec.(...)"
[A sombra das Raparigas em flor. Pag.447]


(...)Esqueceu que hoje é sábado?": riam-se todos por um quarto de hora e tinham a intenção de subir e contar o esquecimento à tia Léonie, para diverti-la. Até o aspecto do céu parecia outro. Depois do almoço, o sol, consciente de que era sábado, passeava uma hora a mais pelas alturas e; quando um de nós, pensando estar atrasado para o passeio, dizia: "Como, são só duas horas?" ao ver passarem as duas badaladas da torre de Saint-Hilaire...(...)"
[No caminho de Swann pag.111]


Perceberam a abordagem do sábado no Vol.1 e 2 de Em busca do tempo perdido?



https://www.plural.jor.br/sempre-teremos-paris/sobre-a-experiencia-de-ler-em-busca-do-tempo-perdido/ 


Na pag 214, Marcel vai dar um passeio enquanto aguarda a avó que saiu para fazer algumas compras , depois de discutir sobre preço com o gerente do hotel. Este parece não tê-la ouvido com o devido respeito. MARCEL anda um pouco pelos arredores e observa uma estátua. Estátua dessa figura apresentada aí acima, no link. Só que há algumas discordâncias na escrita dessa figura histórica, esse corsário francês. Encontrei discordâncias da escrita de Proust: Danguay-Trouin. De qualquer forma, percebemos que Marcel deve se sentir atraído por Danguay e sua vida pelos mares , como corsário . Bem  própria curiosidade dos adolescentes. Incomoda-o pessoas que tomam gelado , perto da estátua ...e ele se sente extremamente solitário , enquanto aguarda a avó.





Bem , Marcel sofre muito por perceber que o tempo destrói tudo , até os afetos. E perder esses afetos, e perder um pouco de si próprio.  Mesmo que já seja um outro você. Pois tudo , o hábito faz parecer normal, e mata seus olhares especiais. Não há dias em que olhamos para nossas fotos e sentimos saudades do que fomos? Mas são momentos, pois logo tratamos de buscar o novo , de renovar a vida. Mas Marcel , por sua doença, tem a necessidade de sugar os instantes ou de não ter consciência deles. O que o está lhe dando segurança, enquanto está no hotel é essa ternura, essa dedicação da avó que procura lhe dar todo carinho todos os cuidados ! Seu fio de ligação com a vida segura de casa!  Esse menino é dono de uma consciência exacerbada por sua imensa sensibilidade. O novo parece que o apavora. Muito mimado, nem uma roupa sabe achar , talvez pelo nervosismo em que se encontre! (Elô)




Elô, vc acha que nesta busca, de Marcel, tem um pouco de desespero?

Sim...há desespero. Marcel busca por ele mesmo! E busca sugar a vida, como o ar que lhe faltava. Sua extrema sensibilidade carrega o complexo edipiano. Mas talvez as convenções fazem com que fuja de si mesmo, coloque uma venda sobre seus olhos! Não lemos todos os livros ainda, mas até aqui é o que percebemos: uma  sensibilidade exacerbada  por todas as artes, e de início é um  viver de  puras sensações, de sinestesias...Ele, Proust, vive numa época em que essa mistura de sensações predomina, se não me engano ...no Brasil recebe o nome de Simbolismo Ele chega a citar o movimento na narrativa, como as vogais tendo cores, mais escuras, mais claras, enfim sugestões...O Simbolismo foi muito forte na França.  Cito de memória,  mas acho que teve forte presença de Verlaine.


Vejam Simbolismo na França.

Acredito até que o texto em francês seja carregado de muita musicalidade e que a tradução não nos permita percebê-la.

Devem haver muitos trechos extremamente musicais , principalmente quando faz descrições da natureza!

As palavras se tornam símbolos  de ligação entre a matéria e o espírito!
















"No   processo   de   interpretação   que   se   manifesta   ao   longo   da   análise
deleuziana é característica a substituição da filosofia e da amizade pelo amor e a arte
como fruto de uma gama de signos e significações resultantes dessa relação, produzidos
pelo choque da memória com o objeto em sua dimensão real. Para a relação de valor
que se estabelece entre o amor e arte e seus comparativos diretos na obra proustiana, a
saber, a amizade e a filosofia, aqueles têm maior importância porque, mesmo um amor
medíocre vale mais que uma grande amizade. Isso ocorre porque o amor se nutre de
uma interpretação silenciosa, sendo rico em signos.

Da mesma maneira acontece
com a valoração atribuída a obra de arte em relação à obra filosófica, pois o que se
subentende na simbologia do signo é mais profundo que as significações explícitas,
provocando uma interação entre os símbolos do amor e da obra de arte em oposição aos
da amizade e da filosofia. A amizade e a filosofia seriam os pontos superficiais de uma
busca pela essência, aos quais a arte e o amor seriam o ponto central, desenvolvidos
sobre o plano da realidade ao ser exposta ao inconsciente interpretativo em que os fatos
passados e presentes dividem-­se de acordo com essa valoração.

Muitos dos objetos e encontros relatados no livro proustiano pertencem ao
sistema da amizade e da filosofia, pois são superficiais em suas relações de importância
na contextualização que Proust descortina como sendo o retrato da sociedade parisiense
da chamada Belle Èpoque, durante o período de tempo a partir do momento em que esta
se consolida até quando entra em decadência, nos é mostrado como o amor e arte são
raros em suas aparições nesse extrato social caracterizado pela superficialidade em lugar
da essência pretendida pelo autor. "










"(...)Porque a aristocracia é coisa relativa. E há
lugarejos onde o filho de um vendedor de móveis é príncipe das elegâncias e tem a sua
corte, como um jovem príncipe de Gales.(...)"




Enfim surgem no romance as raparigas em flor, todas a encantar Marcel !  Sempre as associando às macieiras! Mas há três árvores que surgem ...Qual o seu sentido?  Lembranças de algo remoto,  de algum sonho repetido,  ou manifestações simbólicas  de seu inconsciente? Três?... Elô



"(...)— Cavalheiro — disse-me, dando um passo atrás e com ar glacial —, ainda é muito
jovem e deve aproveitá-lo para aprender duas coisas: a primeira, abster-se de expressar
sentimentos que se subentendem, porque são naturalíssimos; a segunda, não se lançar de
sopetão a responder a alguma coisa que lhe dizem antes de penetrar-lhe o significado. Se
tivesse tomado há pouco essa preocupação, teria evitado passar pelo transe de falar a
torto e a direito como um surdo e acrescentar com isso um ridículo mais a esse ridículo
de usar essas âncoras bordadas no traje de banho.(...)

Tenho necessidade desse livro de
Bergotte que lhe emprestei. Mande-o antes de uma hora por esse mordomo de nome
irrisório que tão bem lhe assenta: é de supor que a estas horas não esteja deitado.
Recordo-me que ontem à noite lhe falei, antes do que devia, nas seduções da juventude,
e vejo que lhe prestaria maior favor se lhe assinalasse a leviandade, a incompreensão e as
inconsequências da juventude. Tenho esperanças, meu jovem, de que esta pequena ducha
lhe há de ser tão saudável como o banho. Mas não fique assim parado, poderia resfriar-
se. Bom dia, cavalheiro

"(...)Há muita gente que começamos a admirar na
infância: um pai mais inteligente que o resto da família, um professor que tem em si os
méritos da metafísica que nos revela, ou um companheiro mais avançado que nós
(Bloch, no meu caso) que despreza o Musset da Esperança em Deus quando ainda nos
agrada, e que, em compensação, quando tenhamos chegado ao bom Leconte ou a
Claude(...)"

A sombra das Raparigas em flor PAG.411



"(...)(Só formava opinião depois de ouvir a mulher, e sua principal missão
consistia em executar, com todo engenho e arte, os desejos desta e dos fiéis(...)"
 No caminho de Swann pag 189


"(...)Ora, mesmo em Paris, Françoise empertigava altiva e
raivosamente o corpo que a idade começava a curvar, ante a mínima falta que lhe
imputassem, ela que era tão humilde, tão modesta e amável quando lisonjeavam o seu
amor-próprio.(...)"

A sombra das Raparigas em flor  pag.298

"(...)Não havia dúvida de que outrora, em
Combray, certas impressões bastante humildes, ou uma leitura de Bergotte, me tinham
levado a um estado de cisma que me parecera de grande valor. Mas esse estado, meu
poema em prosa o refletia; e, se o sr. de Norpois não apreendera e descobrira
imediatamente a beleza que eu ali só encontrava graças a uma enganosa miragem, era
porque ele não se deixava enganar. Acabava de revelar-me, pelo contrário, quão ínfimo
era o meu lugar (quando eu era julgado do exterior, objetivamente, pelo conhecedor
mais arguto e esclarecido). Sentia-me consternado, diminuído; e meu espírito, como um
fluido que só tem as dimensões do vaso que lhe fornecem, da mesma forma que se
dilatara antes até encher as capacidades imensas do gênio, (...)"

A sombra das Raparigas em flor pag. 40

"(...)E cansei-me de
esperar, embora algumas frequentadoras muito humildes, que se diziam operárias, mas
sempre sem trabalho, tivessem vindo fazer-me sala, mantendo comigo uma longa
conversação à qual — apesar da seriedade dos assuntos abordados — a nudez parcial ou
completa de minhas interlocutoras emprestava uma saborosa simplicidade(...)"

A sombra das Raparigas em flor pag.103



https://youtu.be/FujD7KwQZEI

A palestra mesma que é o
modo de expressão da amizade não passa de uma divagação superficial, com que não
adquirimos coisa alguma. Podemos ficar falando a vida inteira sem fazer outra coisa
senão repetir indefinidamente a vacuidade de um minuto, ao passo que o andar do
pensamento no trabalho solitário da criação artística se efetua no sentido da
profundidade, na única direção que não nos está vedada e em que podemos progredir,
embora com mais trabalho, para alcançar uma verdade.

E a amizade não é apenas
destituída de virtudes, como a palestra; é, além disso, funesta. Pois a impressão de tédio,
isto é, de ficar na superfície de si mesmo, em vez de continuar as viagens de exploração
pelas profundezas, que nenhum de nós que obedeça a uma lei de desenvolvimento
puramente interna pode deixar de sentir junto a um amigo qualquer, essa impressão de
tédio a amizade nos persuade a retificá-la quando nos vemos a sós, a relembrar com
emoção as palavras que nos disse o nosso amigo, a considerá-las como um precioso
dom já que não somos como construções a que se podem acrescentar pedras de fora,
mas como árvores que tiram da sua própria seiva o nó seguinte do seu tronco, a camada
superior da sua fronde.

A sombra das Raparigas em flor pag.567







" Como fulgores arrancados por um grande colorista à instabilidade da atmosfera e do sol, a fim de que viessem  ornar uma moradia humana , convidavam-me aqueles crisântemos, apesar de toda a minha tristeza, a gozar avidamente durante a hora do chá os prazeres tão breves de novembro de que faziam cintilar junto a mim o esplendor misterioso e íntimo. Ai, não era nas conversas ouvidas que eu podia atingi-lo; tão pouco se assemelhavam...Até com a Sra. Cottard, e embora já fosse tarde, a Sra. Swann se tornava meiga para dizer : " Não, não é tarde, não olhe para o relógio, que está parado; que pode ter de tão urgente para fazer? " , e oferecia mais um pastelzinho à senhora do professor, que conservava nas mãos o seu porta-cartões.  Pág. 153. 

Eloisa: E o rapazinho ia sendo atraído por todo o  ambiente, protelando sua escrita pretendida.

Eis um momento na casa de Swann e Odete. Um ambiente  que  o rapaz frequentava e se deixava embalar por sonhos e sentimentos de sedução. Onde,  me parece,  que ele é todo levado por vários sentidos. Onde sofre  pela briga com Gilbert  , é seduzido pelo olhar ao  cenário , e por algo ainda indefinido até na meiguice da voz  da Sra. Swann.

Ainda há a instabilidade de uma tarefa a cumprir: escrever sua obra, sempre adiada. A família espera dele o grande texto escrito. E ele vai protelando.


"(...)Mas se, além disso, nos encontramos junto de uma pessoa cuja educação (como para mim a de Albertine) nos é ignorada, desconhecidos os pendores, as leituras, os princípios, não sabemos se nossas palavras causam nela mais efeito que a um animal a que tivéssemos de fazer compreender certas coisas.(...)" PAG.538  😲

Citada por Proust, pag 153. Sobre a roupa que Odete usava em casa , disse ele lembrar uma heroína fos romances de Henry Greville. Ela adotava pseudônimo masculino para escrever. Entrem no link e confiram informações sobre ela e sua obra.




https://www.dancruzplantas.com.br/muda-glicinia-purpura

Imagem que Marcel tem da lembrança de seus passeios   entre 12:15h  e  13 horas , em maio,  sob a sombrinha da sra Swann.  Passeava com ela e uma corte de cavalheiros  pelas ruas de Paris.

Estar sob sua sombrinha era se sentir sob uma latada de Glicínias.

Interessante que o livro 1 termina com um passeio pelo bosque em Paris, já com ela mais velha e com as transformações da cidade.   Mas  neste livro ( À sombra das raparigas em flor,  a primeira parte se chama Em torno da Sra Swann) termina com uma imagem bem florida.

Elô


Um dos salões  onde se faziam encontros literários 








Proust  compara Gilbert à Melusina. À sombra das mocas em flor. Pag. 457,edição da Nova Fronteira . Ela é uma mistura de Swann e de Odete.

"Assim viam-se as duas naturezas, do sr e da sra Swann , ondular, refluir, invadir sucessivamente , uma sobre a outra , o corpo daquela Melusina.  "

A personagem é vista por Marcel de uma forma às vezes impulsiva , às vezes doce , dissimulada...que faz lembrar o tempo das mentiras de Odete.  É carinhosa com o pai , mas temperamental.

Desde muito nova,  faz Marcel sofrer.
(Elô Helena)


" A verdadeira variedade está nessa plenitude de elementos reais e imprevistos, no ramo carregado de flores azuis surgindo, contra toda expectativa , da sebe primaveril, que parecia incapaz de suportar mais flores; ao passo que a imitação puramente formal da variedade ( e o mesmo se poderia argumentar quanto às outras qualidades do estilo) não passa de vazio e uniformidade, isto é, o contrário da variedade , e se com isso conseguem os imitadores provocar a ilusão e lembrança da verdadeira variedade é tão-somente para as pessoas que não a  souberam compreender nas obras-primas."


"(...)Embora se diga com razão que não há progresso nem descobertas em arte, mas somente nas ciências e, como cada artista recomeçando, por sua conta, um esforço individual não pode ser auxiliado nem entravado pelos esforços de qualquer outro, cumpre no entanto reconhecer que, na medida em que a arte evidencia certas leis, uma vez que a indústria as vulgarizou, a arte anterior perde retrospectivamente um pouco da sua originalidade. Desde a época em que Elstir começou a pintar, temos visto muitas dessas chamadas "admiráveis" fotografias de paisagens e cidades.(...)"
A sombra das Raparigas em flor. Pag.490









"(...)A dose de cerveja, e com mais forte razão de champanhe, que em Balbec eu não consentiria em atingir numa semana, conquanto então à minha consciência calma e lúcida o sabor dessas beberagens apresentasse um prazer claramente apreciável mas facilmente sacrificado, eu a absorvia numa hora, acrescentando-lhe algumas gotas de porto, muito distraído para poder saboreá-lo, e dava ao violinista que acabava de tocar os dois luíses que vinha economizando há um mês para uma compra de que não mais me lembrava. Alguns garçons que serviam, à solta entre as mesas, disparavam a toda a velocidade, com um prato sobre as palmas estendidas, parecendo até que não o deixar cair fosse a finalidade desse gênero de corridas. E com efeito, os suflês de chocolate chegavam a seu destino sem derramar-se e as batatas à inglesa, apesar do galope que as deveria ter sacudido, arranjadas, como na partida, em torno do carneiro de Pauillac. Notei um desses empregados, muito alto, emplumado de soberbos cabelos negros, o rosto arrebicado de uma cor que mais lembrava certas espécies de pássaros raros do que a espécie humana, e que, correndo sem pausa e, dir-se-ia, sem finalidade de um a outro extremo da sala, fazia pensar em alguma dessas araras que enchem os grandes aviários dos jardins zoológicos com o seu ardente colorido e a sua incompreensível agitação. Logo o espetáculo se ordenou, pelo menos a meus olhos, de maneira mais nobre e mais calma. (...) (A sombra das Raparigas em flor. Pag.460)





Era o meu camarada Bloch. Saint-Loup me pediu em seguida recordasse a Bloch que se haviam conhecido nos exames do bacharelato, em que Bloch obtivera prêmio de honra, e depois em uma "UNIVERSIDADE POPULAR".(...)" Pag.377


A ideia de uma formação para os operários ganhou proporção após a Revolução Francesa (1789), especificamente, após o projeto de Instrução Pública de Condorcet e os desdobramentos da Comuna de Paris (1871). Porém, enquanto espaço próprio, as universidades surgem a partir de 1896 com George Deherme e com as Bolsas de Trabalho, por Fernand Peloutier. Com base nesses apontamentos o trabalho se debruça para a compreensão da origem dessas instituições, sua expansão na França e influência em terras portuguesas. 



"(...)Se havia passado duas ou três horas falando com Saint-Loup, ainda que ele muito admirasse o que lhe disse, sentia logo uma espécie de remorso, de cansaço e de pesar por não ter estado sozinho e em disposição de afinal escrever. Replicava então a mim mesmo que ninguém é inteligente só para si, que os mais excelsos espíritos gostaram de ser estimados, e que não podia considerar como perdidas as horas que passei a construir um elevado conceito de mim no espírito de meu amigo; convencia-me facilmente de que deveria dar-me por feliz e desejava com vivo ardor não perder nunca esse motivo de felicidade exatamente porque não a havia sentido realmente.(...)"

A sombra das Raparigas em flor. PAG 375


"(...)Aquele jovem, com o seu aspecto de aristocrata e esportista desdenhoso, não sentia curiosidade nem estima senão pelas coisas da inteligência, especialmente por essas manifestações modernistas da literatura e da arte, que tão ridículas pareciam à sua tia; de resto, estava imbuído do que ela chamava as declamações socialistas, possuído de um grande desprezo pela sua casta, e passava horas inteiras estudando Nietzsche e Proudhon. Era um desses "intelectuais" de admiração fácil, que se encerram num livro e não se preocupam senão em pensar elevadamente.(...)"

A sombra das Raparigas em flor PAG.371


 "(...) Contudo, da primeira vez em que entrou no hotel foi muito mal recebido, pois o pessoal que acabava de chegar da Côte d'Azur ignorava quem fosse aquele senhor. E não só não viera de flanela branca, mas também, fiel aos velhos usos franceses e ignorante da vida dos Palaces, tirara o chapéu ao entrar no hall porque havia senhoras; de modo que o gerente nem sequer levou a mão ao boné para saudá-lo e julgou que aquele senhor devia ser de origem humilde, o que ele chamava de homem "saliente do comum". A mulher do notário, única pessoa a quem chamou a atenção o recém-chegado, que denotava essa afetada vulgaridade da gente elegante, declarou, baseada no infalível discernimento e indiscutível autoridade de uma pessoa para quem não tem segredos a alta sociedade do departamento do Mans, que logo se via perfeitamente tratar-se de um homem de grande distinção, muito bem-educado e em notável contraste com toda aquela gente que havia em Balbec, e que ela julgava indignos de convívio enquanto não os visitasse.(...)"

A sombra das Raparigas em flor. Pág.312


"Não sei se o encanto selvagem daquele lugar aumentava o daquela rapariga, fazendo-me crer que não era igual às outras, mas o fato é que ela o devolvia ao ambiente. Deliciosa me pareceria a vida se ao menos eu pudesse, hora por hora, passá-la com ela, acompanhá-la até o rio, até a vaca, até o trem, estar sempre ao seu lado, sentir-me conhecido dela, tendo o meu lugar no seu pensamento. Ela me iniciaria nos encantos da vida rústica e das primeiras horas do dia. Fiz-lhe um sinal para que me servisse café com leite. Tinha necessidade de ser notado por ela. Não me viu, chamei-a. Acima de seu corpo muito grande, a pele do rosto era tão dourada e rósea que parecia vista através de um vitral iluminado.(...)" 

A sombra das Raparigas em flor. Pag.283


"(...)Desde os últimos dias do ano, essa carta parecia-me bastante provável. Talvez não o fosse, mas, para acreditar nessas coisas, basta-nos o desejo e a necessidade de que sejam possíveis. O soldado está convencido de que tem diante de si um espaço de tempo infinitamente adiável antes que o matem; o ladrão, antes que o prendam; o homem, em geral, antes que o arrebate a morte. Esse é o amuleto que preserva os indivíduos — e às vezes os povos — não do perigo, mas do medo ao perigo; na verdade, da crença no perigo, motivo pelo qual o desafiam em certos casos, sem que sejam necessariamente bravos.(...)" 

A sombra das Raparigas em flor  PAG.227 


"(...)Assim, os que produzem obras geniais não são aqueles que vivem no meio mais delicado, que têm a conversação mais brilhante, a cultura mais extensa, mas os que tiveram o poder, deixando subitamente de viver para si mesmos, de tornar a sua personalidade igual a um espelho, de tal modo que a sua vida aí se reflete, por mais medíocre que aliás pudesse ser mundanamente e até, em certo sentido, intelectualmente falando, pois o gênio consiste no poder refletor e não na qualidade intrínseca do espetáculo refletido.(...)"

A sombra das Raparigas em flor pag.165


https://youtu.be/FsG7DKAJZs0

https://youtu.be/mge8SEPt3iY

Assista a "Ricardo Lísias sobre Marcel Proust (aula 3: À Sombra das Raparigas em Flor)" no YouTube

https://youtu.be/LbAIxWR4Myk

https://lithub.com/reading-proust-in-a-black-and-white-world/ 

https://youtu.be/2j-qlOpOaKw

https://youtu.be/VnaZy3YCguc

https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Gliptoteca

https://pt.frwiki.wiki/wiki/Balbec











4 comentários:

  1. Apaixonante , tudo é apaixonante, e nós desperta também para o mundo das coisas mudas , mas que parecem nos falar , coincidir ou refutar os nossos pensamentos!

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  2. ...e nos despertar também....correção.

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  3. Oh, meu Deus! Só não passa a saudade do sabor do leite tirado na hora dentro da caneca com café fresco da roça. Se houver algo que ninguém pode nos roubar são as memórias. Sonia

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