Leitura de referência - Shalimar, o equilibrista: Salman Rushdie
Debate: 11 de setembro de 2015 - 19:00 h
Livraria Icaraí - Icaraí - Niterói
I
Doi-me o coração, e um torpor letárgico
Fere meu sentido, como se tomasse cicuta,
Ou ingerisse até o fim algum ópio
Instantes atrás, e ao Letes me precipitasse.
Não que inveje teu alegre destino
Mas por ser feliz com tua alegria -
Que tu, Dríade das leves asas,
Num lugar melodioso
De faias verdes, e sombras incontáveis,
Celebras a plena voz teu canto de verão.
II
Oh! Gole farto de vinho velho!
Fresco há muito no profundo coração da terra,
Com sabor da Flora e verdes prados,
Dança e canção Provençal, alegria queimada de sol!
Oh! taça plena do quente Sul
Cheia da vera e rubra Hipocrene
Com borbulhas qual contas piscando nas bordas,
Boca tinta de púrpura;
Se pudesse beber, e sumir deste mundo,
E contigo desvanecer na escura floresta.
III
Desvanecer, dissolver e deslembrar
O que tu entre as folhas jamais conheceste
O fastio, a febre, e o frêmito
Aqui, onde os homens sentam e se escutam gemer;
Onde a paralisia agita os últimos parcos cabelos brancos,
Onde os jovens empalidecem, e morrem qual espectros;
Onde apenas pensar causa a dor
E o desespero dos olhos plúmbeos,
Onde a Beleza não pode suster seus olhos brilhantes,
Nem um novo Amor definhar mais um dia.
IV
Longe, Longe! A ti voarei,
Não na carruagem de Baco e seus leopardos,
Mas nas invisíveis asas da Poesia
Embora o turvo cérebro retarde e confunda.
Já contigo! Suave é a noite,
E talvez a Rainha Lua esteja em seu trono
Cercada por suas Fadas estelares;
Mas aqui não há luz,
Senão aquela que do céu com as brisas sopra
Pelas glaucas trevas e sendas sinuosas de musgo.
V
Não vejo que flores estão a meus pés,
Nem qual suave incenso dos ramos exala,
Mas, na treva embalsamada, desvelo o aroma
Que cada mês regala
A relva, a coifa, as frutíferas árvores silvestres;
Branco pilriteiro e madresilva pastoral;
As violetas que cedo murcham veladas sob as folhas;
E a primeira filha dos meados de maio,
A rosa de almiscar, no vinho de orvalho imersa,
Murmúrea paragem de moscas das tardes de verão.
VI
No escuro escuto; por várias vezes
Que tenho sido seduzido pela suave morte,
Lhe dando ternos nomes em versos refletidos,
Para que pegasse no ar meu sutil alento;
Nunca como agora me parece tão boa a morte,
Findar a meia-noite sem nenhuma dor,
Enquanto tu em torno desvanesces a alma
Neste êxtase!
Ainda cantarias, e de nada valeriam meus ouvidos -
A teu alto réquiem em terra transformado.
VII
Não nasceste para a morte, Ave imortal!
As gerações famintas não pisam em ti;
A voz que escuto esta noite foi ouvida
Pelo palhaço e o imperador nos tempos remotos.
Talvez a mesma melodia que encontrou lugar
No triste coração de Rute, quando, saudosa do lar,
Chorou entre o trigo estrangeiro;
A mesma que várias vezes encantou
As mágicas janelas, abertas sobre a espuma
Dos mares perigosos, nas encantadas terras perdidas.
VIII
Perdidas! Esta palavra é como um sino
Que, dobrando, me faz voltar a mim mesmo!
Adeus! A fantasia não pode tanto iludir
Como parece, ó elfo ludibriador.
Adeus! Adeus! Teu hino pungente se esvai
Além dos prados vizinhos, sobre o tranquilo riacho,
Subindo o monte; é agora profundamente enterrado
Nas clareiras do vale ao lado.
Foi esta uma visão ou sonhei desperto?
A música se foi: - Estarei dormindo ou acordado?
ODE A UM ROUXINOL
A “Ode a um rouxinol”, uma das prediletas no grupo das grandes odes, trata da felicidade que é o canto do rouxinol, das tristezas do mundo e da sedução da morte; todavia o canto da avezinha transcende a mortalidade e é tão belo que o poeta, no fim, indaga se não terá sonhado. Jorge Luis Borges toma a ode como “fonte de inesgotável poesia”. Além do rouxinol que havia na casa de Hampstead, conta-se que uma noite da primavera de 1819, Keats se encontrava com Severn e outros companheiros na “Spaniard’s Inn”, em Hanpstead Heath; Severn percebeu de repente que Keats se havia eclipsado e deu com ele, sob um grupo de pinheiros, a ouvir um rouxinol. Keats seguiu a inovação de Coleridge, que foi o primeiro, diz-se, a fazer do canto do rouxinol um canto de alegria. Dias antes de escrever a ode, Keats conversara com Coleridge, e na palestra entraram rouxinóis. A ode foi publicada nos Annals of Fine Arts em julho de 1819, contendendo-se sobre se foi escrita no início ou em meados de maio, se antes ou depois da “Ode sobre uma urna grega”.
Perfeito, agradeço profundamente pela publicação!
ResponderExcluirMuito grata por poder ter acesso a esta maravilhosa Ode!
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