Natal! Alegria!
Os sinos na Catedral
fazem bailar pássaros.
Tempo de Natal!
De amor e muita harmonia.
Seja, assim, no CLIC.🎄💞
Mais uma vez, chega o Natal. Mais uma vez,
retornam as recordações dos Natais de minha infância.
Comemorávamos na
casa de meus avós. Eles faziam questão de que toda a numerosa família, nove
filhos, muitos netos e até bisnetos, estivesse presente.
A mesa da sala de
jantar era imensa e, ali, todos se acomodavam. Quanto mais juntinho melhor.
Havia muito carinho e harmonia. Vô Chico, à cabeceira, quase não falava, era
seu jeito, mas os olhos sorriam e diziam de sua alegria vendo todos reunidos.
Lembro bem do
aroma adocicado daquela casa. Era vizinha de uma fábrica de balas. A doçura
atiçava a gula da criançada e, certamente, a de muitos adultos. Sr. Álvaro, o
proprietário, presenteava-nos com muitos sacos de balas de todas as cores e
formas: vermelhas, amarelas, azuis, verdes, redondas, estrelinhas, bengalinhas
...
Antes de
iniciarmos a ceia, meu avô fazia uma prece, não sei se de improviso ou
originária de Portugal. Todos a ouviam contritos, com exceção de nós crianças,
principalmente eu, que não parávamos quietas, implicando umas com as outras e
recebendo, baixinho, repreensões de nossas mães. Após a oração, brindávamos a
vinda do “Menino”.
Havia frutas
secas, frutas frescas, bacalhau em postas, bolinhos de bacalhau, uns bolinhos
fritos, de abóbora, deliciosos, que só minha avó Cotinha sabia fazer, rabanadas
com leite e com vinho, pastéis de Santa Clara e outras iguarias. Sendo uma casa
portuguesa, não podia faltar, evidentemente, um bom vinho da “terrinha”. Para
as crianças, havia groselha.
A hora mais
esperada, entretanto, era a da chegada de Papai Noel. Alvoroçadas, não
parávamos de perguntar se já estava na hora. Meia-noite em ponto, os sinos da
Igreja de São Lourenço, no Ponto de Cem Réis, começavam a tocar alegremente e o
velhinho, vindo do corredor, com um saco enorme às costas, entrava na sala e
era aplaudido por todos.
Em cada presente,
encontrava-se colado o nome do presenteado e o conselho que Papai Noel deveria
dar-lhe. Ainda acreditávamos que o velhinho viria dirigindo um trenó, ou mesmo num
trem especial. Por isso, eu pensava comigo: será que Papai Noel abre uma
janelinha entre as nuvens para espiar o que estamos fazendo aqui embaixo?
Na hora da entrega
do presente, ele chamava a criança e, antes de entregá-lo, dava os conselhos:
“Pedrinho, você precisa estudar mais. Está muito preguiçoso”. “Zeca, não seja
tão malcriado com seus pais”.
A mim, ele dizia:
“você é muito levada! Vive caindo e traz, sempre, um curativo na perna, no
braço e, até, na testa. Precisa ser mais sossegada!”... Prometíamos
emendar-nos. Mas, no ano seguinte, repetiam-se os conselhos. As promessas eram
esquecidas.
Meu pai,
comerciante, na época do Natal, atrás do balcão, trabalhava muito. Era
simpático, paciente e, por isso, todos os fregueses da loja faziam questão do
seu atendimento. Mas eu não entendia e ficava triste por ele nunca estar
presente quando Papai Noel chegava. Trabalhar até meia-noite era demais,
pensava. Minha mãe explicava-me que ele estava ajudando o patrão a contar o
dinheiro recebido no dia. Eu não aceitava a explicação. Achava seu patrão um
homem muito exigente. Sem sentimento. Quando ele chegava, logo depois que Noel
partia, pendurava-me no seu pescoço, cobria-o de beijos e dizia: que pena,
papai, mais uma vez, você não viu Papai Noel!
Assim eram nossos
natais e, assim, se repetiam todos os anos. Às vezes, com algumas mudanças: um
bebê novo que havia chegado, uma tia velha vindo de Portugal e, por isso, a
ceia era mais alegre ainda.
Quando já tinha
dez anos, resolvi acompanhar Papai Noel pelo corredor quando ele se retirou da
sala. Andava desconfiada... Vi quando entrou no quarto de meus avós. Que mal
educado! Pensei. Entrar no quarto deles sem pedir licença. Será que está
cansado e vai tirar uma soneca? Nesse momento, a porta abriu-se e eu me escondi.
Meu pai saia, deixando as roupas, o saco, as botas, a barba postiça, tudo
espalhado em cima da cama. Minha decepção foi enorme, mas, naquele momento,
acabava de descobrir o motivo de sua ausência permanente. Ele era o Papai Noel!
Escondi o segredo. Não contei nem para o meu irmão. Sentia um misto de
tristeza, pois gostaria de continuar acreditando no Papai Noel, e de orgulho,
por compartilhar o segredo com os adultos. Por coincidência, no dia seguinte,
tio Manoel chamou- me, e ao meu irmão, para uma conversa em particular.
Disse-nos que estávamos ficando mocinhos e precisávamos saber a verdade.
Suavemente, revelou-nos o que eu já sabia: Papai Noel era o nosso pai. Fingi
surpresa. Quanto ao meu irmão, custou a conformar-se. Não admitia ter sido
enganado.
Poucos foram os
Natais que comemoramos com o ”Papai Noel”, após a revelação. Em setembro de
1949, ele partiu, prematuramente, aos quarenta e seis anos. Nenhum outro queria
ocupar seu lugar. Ele era insubstituível. Aos menores, foi dito que o velhinho
estava cansado, e, por essa razão, não viria. Minha mãe, eu e meu irmão
comemoramos o Natal em casa, sozinhos, sentindo sua falta. Mas, como disse
Bartolomeu Campos de Queirós: “Na morte, a ausência ganha mais presença”. Ele
estava presente. Entre nós.
Elenir Ocupa a cadeira 14 do CLIc |