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18 de agosto de 2023

Infâmia: Ana Maria Machado




Ana Maria Machado no CLIc em 1 de março para debater "Infâmia". 
Transmissão pela Web - ao vivo 
Imperdível!
Ana Maria Machado, membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), desde 2003 ocupa a cadeira número 1 da ABL, e é considerada pela crítica uma das mais importantes escritoras brasileiras contemporâneas.
Em seu romance "Infâmia", Ana Maria Machado faz uma releitura de duas histórias bíblicas  na realidade brasileira atual: as infâmias sofridas pela casta Suzana e por José em terras do Egito. Ao contrário das edificantes histórias bíblicas protagonizadas pelo profeta Daniel e por José, filho de Jacó, as infâmias brasileiras acabam em tragédias: Custódio, funcionário público, um José moderno, tem sua honra destruída ao detectar indícios de corrupção na repartição onde trabalha. Cecília, a Suzana moderna, uma brasileira difamada pelo próprio marido e silenciada pelo formalismo protocolar das relações internacionais, torna-se vítima do que poderíamos chamar de um apedrejamento moral.
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Resumo da história de José: José foi vendido pelos próprios irmãos como escravo a mercadores e posteriormente adquirido por Potifar, comandante da guarda do faraó egípcio. José logo ganhou a confiança de Potifar, passando a ser responsável pelos negócios da casa deste. Foi então que José passou a sofrer o assédio da esposa do comandante, que convidou-o a deitar-se com ela. José recusa veementemente trair seu senhor pois este lhe confiara tudo em sua casa, menos a própria esposa. Continuou a mulher em suas tentativas até que, certo dia, estando sozinhos, ela mais uma vez insistiu. José fugiu, mas ela segurou-lhe a capa, que ficou em sua mão. A mulher então, gritando, fez vir a si os homens da casa e, apresentando a capa de José como prova, acusou-o de tentar levá-la para a cama. Quando Potifar chegou em sua casa, a esposa anônima repetiu-lhe a história engendrada e este encolerizou-se. José foi então enviado para a prisão.

Para conhecer a história da casta Suzana, leia postagem anterior do blog clicando aqui

Trecho da entrevista de Ana Maria Machado ao Conexão Roberto D'Ávila, exibido em 19 junho de 2011 pela TV Brasil (extraído do Especial de Ano Novo - Conexão Roberto D'Ávila - 2012):

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Opiniões dos Leitores:



WB:



Cês estão gostando de nossa leitura atual? Da Ana Maria Machado eu só havia lido Alice e Ulisses, e isso já faz tanto tempo que não lembro chongas. Estou apreciando Infâmia. O texto flui muito bem, com bastante naturalidade, não dá vontade de parar.



Um detalhe sobre a edição que eu tenho: apesar de as páginas serem meio escuras, não me parecem feitas com papel reciclado (a Rita havia dito que eram, acho), pois não vi nenhuma referência a isso nos dados sobre a publicação. Será  se a colega se equivocou ao nos dar a informação?

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Rose T

O que eu tenho a dizer é que estou amando Infâmia!!! Quase no final!!!!

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Rita:



Sobre Infâmia, eu achei que era papel reciclado sim, não só pela cor como também pela textura, e como no dia da votação eu já tinha comprado mas ainda não tinha lido, na ânsia de defender o voto falei até do cheiro, lembra? Foi mais no estilo brincadeira, mas se colar é bom, sabe como é? 

Agora, falando sério, o papel que importa do livro é a grande reflexão que ele nos leva a fazer sobre nossas atitudes, a crença absurda numa imprensa comprada e descompromissada com a verdade, as consequências de uma frase leviana para toda a vida de quem foi caluniado. Fico feliz que tenha defendido a proposta original da Cintia, uma excelente leitura.

... Nunca tinha parado para pensar nas respectivas primeiras-damas, mas talvez povoasse meu imaginário a ideia de uma vida boa, sem preocupações financeiras, um pouco de glamour. Ana Maria nos traz o outro lado, o casamento de aparências, o rigor do comportamento esperado, as regras que se aplicam ao marido e à mulher, bem diferentes, a opressão sofrida pela filha do embaixador, também ela casada com um embaixador, a depressão subsequente, a manipulação do marido, sua crueldade, a covardia de ambos, o medo da mulher, a falta de visão de alternativas, a opção derradeira. Muita sujeira por baixo do tapete.



Transpondo para outras realidades, para as que conhecemos, inclusive a nossa, o que encontramos de comum? Esse é o cerne da questão que me interessa. O livro ratifica minha opinião de que não devemos compactuar com nada que nos traga infelicidade, não esconder os problemas, discuti-los, tentar uma solução que não maltrate o coração, mas se não der, partir para outra, sem a preocupação paralisante do que os outros vão pensar. Isso é um atraso que pode ser fatal e o tempo, sabemos, não para.



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Oi Rita


Essa possibilidade de ter uma ótica não imaginada é que nos engrandece e flexibiliza, que nos minimiza a chance de cometer infâmias. Clarice Lispector viveu esta situação como esposa de diplomata e nos deixou registrado sua angústia e desamparo. 

Quanto à sujeira por baixo do tapete, a sensação é de uma terrível impotência.  O verso que traduz o sentimento é do Quintana: "há tanta coisa para denunciar, mas a quem?".   Acredito que o Papa diria a mesma coisa...

Durante a leitura do livro, fiquei lembrando também da estratégia do Amós Oz: perceber a normalidade em meio à anormalidade, escrever sobre pessoas comuns e seu cotidiano em situações limites para que a poesia e a arte prevaleçam, para não dar vitória à opressão. Como é difícil adotar este olhar que busca a luz...  

Já acabei a leitura e estou preparando o bastão da fala...

Considerei o livro um compartilhar, uma denúncia, uma  crítica feroz, um reconhecimento do quanto estamos imersos em sistemas desumanos, que incapacitam o restabelecimento da vida e a dignidade perdidas.

O considerei um convite ao olhar mais sistêmico, ao questionamento socrático. Manoel de Barros como antídoto: “só dez por cento é mentira, o resto é invenção”; “as coisas jogadas fora tem grande importância, como um homem jogado fora...”; “é preciso desver o mundo, é preciso transver o mundo.”

As duas primeiras infâmias trazidas na narrativa foram desconstruídas com perguntas simples que tornavam óbvia a farsa e estancaram a fértil criatividade para o mal.

Uma das expressões que mais me impactaram foi a da “êxtase da santidade”: aquele estado que parece autorizar cada um a julgar o outro de forma hipócrita.

Agradeço à Cinthia pela indicação, perseverança e atitude ao convidar a autora.  Seu rico caminho literário transparece na escrita do livro, por exemplo, ao citar a lucidez da cegueira na literatura... como foi bom reler uma frase do Saramago: “A única coisa mais terrível que a cegueira é ser a única pessoa que consegue ver.” (p. 156).

Gostei da ênfase à importância do contexto: “A descontextualização é uma forma de desonestidade intelectual.” (p. 65). Fez-me lembrar de um trecho do “O lobo da estepe" de Hermann Hesse (1995, Vozes, p. 26):

“Um homem da Idade Média condenaria totalmente o nosso estilo de vida atual como algo muito mais cruel, terrível e bárbaro.  Cada época, cada cultura, cada costume e tradição têm o seu próprio estilo, têm sua delicadeza e sua severidade, suas belezas e crueldades, aceitam certos sofrimentos como naturais, sofrem pacientemente suas desgraças.”

Ainda desejo destacar outros pontos preciosos encontrados no livro, o que farei em breve.

Boa tarde a todos!

Cris


3 comentários:

  1. Livro importantíssimo. Autora magnífica. Reunião imperdível!

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  2. Foi muito interessante participar da reunião do Clube de Leitura via Twitter. Cada um expressando o que encontrou no livro "Infâmia", de Ana Maria Machado, e que serviu de base para novas reflexões. Opiniões divergentes surgiram, o que só enriqueceu o grupo. Parabéns!

    Sonia Salim

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    Respostas
    1. Que ótimo, Sonia. Isso faz o clube crescer e alcançar novos patamares. Depois da transmissão pela web, penso quando pudermos também ter a interação instantânea com quem está assistindo, de modo que participe ativamente, com colocações, perguntas, depoimentos. Se sonhar é o primeiro passo para realizar, já estamos na caminhada.

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