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3 de agosto de 2015

O visionário do Império

Por Wagner Medeiros Junior

Do palacete na Rua do Imperador - um dos mais luxuosos da capital do Império - avistava-se a residência oficial de D. Pedro II: o Palácio de São Cristovão. O palacete era o símbolo da ascensão de um menino nascido no Arroio Grande, na fronteira entre o Rio Grande do Sul e o Uruguai, em 1813. Seu nome é Irineu Evangelista de Souza – Barão e Visconde de Mauá.
Irineu chegou ao Rio de Janeiro, aos nove anos, pelas mãos de um tio. Vinha com a guarda transferida pela mãe, Mariana de Jesus, por rejeição do padrasto - aos cinco anos havia perdido o pai, João Evangelista, assassinado por ladrões de gado. É empregado, então, como caixeiro do comerciante português Pereira de Almeida, em troca de comida e cama, como era comum à época. Aos 15 anos é promovido à guarda-livros, pela aptidão e conhecimento minucioso dos negócios.
Em 1829 o comércio de Pereira de Almeida é transferido ao escocês Ricardo Carruthers. Irineu percebe novas oportunidades e passa a dedicar o tempo vago aos estudos, inspirado nos conhecimentos do novo chefe. Carruthers, por sua vez, vê no jovem talento a capacidade para torná-lo gerente da casa Carruthers & Cia em 1834. Um ano depois, faz de Irineu, aos 24 anos, seu sócio, quando resolve retorna à Escócia.  
A primeira viagem de Irineu à Europa acontece em 1840, quando visita diversas indústrias e conhece o mundo das finanças e das grandes corporações inglesas, em um momento de superprodução e crise. Cheio de novas ideias, ainda em solo europeu, cria com os amigos a empresa Carruthers, De Castro & Cia, para captar dinheiro no mercado inglês e investir no Brasil. 
Nesse período, aqui predominava a crença escravocrata de que a riqueza só poderia ser produzida pela agricultura e pelo comércio. O trabalho era desprezado: uma atividade humilhante, destinada aos lacaios e escravos.
De volta ao Brasil as ideias estavam consolidadas. Irineu trabalha para remover as barreiras políticas e conceber e executar novos e ambiciosos projetos. Passo a passo, com prudência e moderação, passa a empreender cada um deles, sempre pensando em atender as expectativas dos sócios. Como aliado tem a motivação dos colaboradores e “uma política administrativa fora dos padrões brasileiros”, como diz Jorge Caldeira em “Mauá: Empresário do Império”.
Aos 40 anos Irineu Evangelista já era um homem abastado. Possuía uma fundição com 700 operários; um estaleiro no Brasil e outro no Uruguai; uma companhia de navegação no Amazonas; três estradas de ferro; bancos no Brasil, Inglaterra, França, Estados Unidos, Argentina e Uruguai; fábricas diversas, fundições e mineradoras; estâncias de criação de gado e empresas de comércio exterior. Era ainda concessionário da Companhia de Iluminação à Gás e de linhas de bonde. 
O montante dos negócios do Barão e Visconde de Mauá em 1867 chegava a 115 mil contos de reais, só comparável ao orçamento do Império, que era da ordem de 97 mil contos de reis.
Para administrar tantas empresas usava a política de descentralização, atribuindo responsabilidade de decisão aos gerentes e valorizando a remuneração do trabalho. Por isto, limitava a utilização de escravo a apenas quando faltasse alternativa. Neste caso, optava pelo aluguel, tratando igualitariamente o escravo com o trabalhador livre.
Contudo, para a sociedade escravocrata e a corte imperial brasileira, Mauá cometia a heresia do lucro. Seu universo de negócios era incompreendido e invejado, em um mundo em que os grandes empreendimentos estavam sob o controle do Estado, o que o fazia também intolerante. 

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Preto no Branco por Wagner Medeiros Junior

3 comentários:

  1. UM VISIONÁRIO, UM HOMEM ACIMA DE SEU TEMPO. PRECISAMOS DE PESSOAS ASSIM , EM NOSSO PAIS.

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  2. Parabéns ao Wagner por mais um texto importante, histórico e necessário. Mas a saga do Barão de Mauá merece uma continuação. Por favor, é apenas uma observação: a força negativa contrária ao Barão também merece mais de três linhas. Mostrava, já naquela época, os entraves ao desenvolvimento brasileiro. Dessa história bela de um homem e tristemente retrógrada de uma sociedade sofremos ainda, pois desse embate saiu vitoriosa a parcela atrasada da então "nobreza" rural brasileira. Gente que ainda está por aí, modo de pensar que ainda vigora nas mentes de muita gente formada e com altos cargos. Tivemos tão poucos Mauás... E temos tantos barões... Profundo lamento.
    Carlos Rosa Moreira

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    1. Caríssimo Carlos Rosa Moreira,
      Primeiramente, agradeço imensamente por seu comentário e observação. Quanto a esta última, você tem razão. Oportunamente voltarei ao tema, pela importância. Entretanto, muitos dos artigos postados aqui no blog do Clube de Leitura são escritos também para a revista "Cachoeiro Cult", onde tenho limitação de espaço, o que me impede de abordar muita coisa que gostaria. É inclusive este o caso do presente artigo. Muito oportuno seus comentários. Obrigado!

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