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17 de novembro de 2020

A febre da terra e as drogas do sertão


Por Wagner Medeiros Junior
Após a expulsão dos franceses do Maranhão, em 1615, o português Francisco Caldeira de Castelo Branco é nomeado para comandar uma expedição militar com o fim de explorar o território do Grão-Pará e conter as incursões estrangeiras, que partiam da França, Holanda e Inglaterra. A proteção da foz do Amazonas era estratégica para manter a posse do território do Grão-Pará e seu rico estuário sob controle ibérico, uma vez que a coroa portuguesa encontrava-se sob o domínio da Dinastia Filipina (1580-1640).
Logo que chega à baia do Guajará, em 12 de janeiro de 1616, o capitão-mor Castelo Branco ordena a construção de um forte, nominando-o Forte do Castelo do Senhor Santo Cristo do Presépio de Belém. Depois é levantada uma pequena capela e iniciada a construção de um povoado, que recebe o nome de “Feliz Lusitânia” e mais tarde passará a chamar-se Belém. Começava ali um pequeno núcleo da colonização e expansão da presença portuguesa na América, em um vasto território que pelo Tratado de Tordesilhas pertencia à Espanha.
A região da baia do Guajará encontrava-se habitada pelos índios Tupinambás. Com a chegada dos primeiros colonos a reação dos nativos é atroz. Os Tupinambás cultuavam as tradições de seus antepassados e não conheciam a cobiça e o sentimento de posse. Por sua cultura resistiam ao trabalho forçado e o julgo ao colonizador, o que tornou a ocupação do Grão-Pará deveras árdua e tensa, marcada por rastros e rastros de sangue, pois à medida que a exploração da terra avançava, muitas tribos iam sendo dizimadas e mais índios capturados, com objetivo exclusivo de escravizá-los.
O domínio da região amazônica implicou ainda no rechaço ao corso e na destruição de toda feitoria estrangeira que fosse encontrada. Cada carregamento de madeira e dos outros produtos extraídos da floresta, entre eles as chamadas “drogas do sertão”, alcançava excelentes valores na Europa. Daí o ímpeto bélico luso e seu projeto de conquista com o intuito de manter o monopólio desses produtos, o que tornava imperativo a exclusão das demais potências européias.   
Assim, aos poucos, novos cursos de rios e terras foram sendo conquistados e explorados. Da entrada do atual estado do Maranhão ao Amapá, do alto ao baixo Amazonas, do Tocantins ao Negro extraia-se o óleo de copaíba, cacau, canela, baunilha, pimenta, salsaparrilha, urucu, castanhas, anil, couros diversos, entre tantos outros produtos. Segundo a historiadora Magda Ricci, em seu ensaio “Cabanos, patriotismo e identidade: outras histórias de uma revolução”, mais que a quantidade de produtos, sua diversidade e necessidade na Europa tornavam o comércio com o antigo Grão-Pará peça fundamental no mundo ultramarino português.
Por esta razão, o Grão-Pará acabou por se tornar uma colônia de influência predominantemente portuguesa. A colônia foi oficialmente criada em 1626, durante o reinado de Felipe III de Portugal e IV da Espanha, com o nome de Colônia do Grão-Pará e Maranhão. Ela englobava, além do atual Pará, o Amazonas, parte do Ceará, Maranhão e Piauí. Neste período a colônia do Brasil já abarcava as demais possessões portuguesas na América, onde predominava a monocultura da cana de açúcar e o engenho. Em função da vocação extrativista, a colônia cresceria fortemente ligada a Portugal, sem grande laço com o Brasil.
A expansão da atividade extrativista no Grão-Pará induziu a agricultura de subsistência e a criação do gado, alimentando um modelo econômico que se sustentava na exploração da terra e na escravização do índio. Este modelo atraiu as missões católicas, visando inicialmente a proteção e a catequese dos nativos. Entretanto, o trabalho missionário também implicava na utilização do trabalho dos índios, como necessitava de grandes espaços de terra para produção e exploração dos recursos da floresta, o que colocou as missões em concorrência e conflito com o colono português.
Mais tarde, com a escassez de índios para aplicação da mão de obra na lavoura, e a introdução da monocultura do algodão, é que a escravidão do negro africano é instituída nas possessões do Grão-Pará e Maranhão.

Visite o blog:  Preto no Branco por Wagner Medeiros Junior

5 comentários:

  1. Show de bola! Não conhecia esses fatos.

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    1. Caríssimo Evandro, Saber ser lido por uma pessoa tão ímpar como você é uma satisfação enorme. Muito obrigado pelos constantes incentivos.

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  2. Parabéns pelo texto, Wagner. Bem escrito e de conteúdo muitíssimo interessante. Nestes tempos de desmoronamento da nossa cultura, textos como o seu são um refrigério para a alma.
    Carlos Rosa.

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    1. Caríssimo Carlos Rosa,
      Obrigado por suas palavras. Elas dão combustível para realização das pesquisas e a elaboração do trabalho.

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