Fundado em 28 de Setembro de 1998

21 de fevereiro de 2019

Desonra - J. M. Coetzee (prêmio Nobel 2003)

Aos companheiros de Clube uma pergunta básica sobre o livro do mês, rabiscada assim:

Afinal
a desonra é qual?
A do professor com a aluna?
A da aluna com o professor?
Ou a da punição-arranjo
para que se passe uma borracha
às custas de uma desculpa
na qual não acredita
nem quem pede, nem quem dá?

Ou a desonra é a da filha
que absorve a violência
e se submete ao arranjo-punição?

Ou, afinal, é de todo o mal arranjado
esboço de nação
que Desonra nos fala?

A aluna, calada, que diz sim.
O professor falante que se recusa a negar a coisa feita.
E a filha 
que se interioriza 
e aceita.

Cada qual com sua honra.
Em cada uma, um preço a pagar.
Afinal
a desonra é qual?

- - - - - -
Abs,

Newton




Aquele que vai ensinar acaba aprendendo a melhor lição, enquanto os que vão aprender não aprendem nada. p. 11




O Clube da Sete leu Desonra de J. M. Coetzee. Leia a análise feita pelo coordenador Roberto Pedretti:

"... há alguns anos duas senhoras de Ipanema trocavam indicações literárias mútuas à frente da seção de Literatura Estrangeira, com muito entusiasmo, quando pululou nas mãos de uma delas um exemplar de "Desonra", casualmente. A outra reagiu com um gritinho de ansiedade e êxtase: "Amiga, leva esse!, leva!, pode levar que é ma-ra-vi-lho-so!!". 

Eu estava apenas na audiência, a meia distância, mas caso elas tivessem me pedido qualquer opinião, eu certamente não teria considerado o adjetivo ma-ra-vi-lho-so como uma possibilidade. Soberbo, sem dúvida; incrivelmente bem construido; impossível de largar etc. Ma-ra-vi-lhoso, no entanto, estava fora da minha palheta. Afinal, "Desonra" é desagradável, melancólico, indigesto e pode fazer com que você conclua a leitura com um pouco menos de esperança na humanidade. 


Um dos temas recorrentes de Coetzee, a tirar pelos seis livros que tive a oportunidade de ler, é a degradação - quão baixo um ser humano é capaz de chegar sem misturar-se aos demais bichos da Criação. Do outro extremo, também recorre muito à questão do reconhecimento da vida animal como legítima, digna de proteção e respeito ("A Vida dos Animais", "Elizabeth Costello" e o próprio "Desonra" são exemplos. Mas não usa como militância crua, "real", mas antes como alegoria da própria degradação. Queda e ascensão fazem com que as espécies se encontrem em algum ponto do caminho, e que nós, como humanos, perguntemos: o que podemos afinal arguir a nosso favor? 



Alguns dos livros mais duros que li de Coetzee, como "O Mestre de Petersburgo" e "À Espera dos Bárbaros", tinham um quê de fantasia que amortecia essa descida ao inferno (Dostoievsky como protagonista no primeiro, ou o país inventado do segundo). A questão com “Desonra” é que ele é plausível demais, a história muito corriqueira, tanto que quase podemos jurar que já deve ter acontecido igualzinho em algum lugar. Esse realismo é que deve tornar o livro o mais impactante de todos. 



P.S.: Parece que do Nobel para cá todo mundo tem que colocar uma foto do senhor Coetzee com jeito de durão, de quem comeu um limão inteiro no café. Optei por ilustrar o texto aqui com uma mais amena, provavelmente da década de ’90, quando ele já era uma celebridade especificamente sul-africana.







4 comentários:

  1. O livro conta a história de David Lurie, um homem que cai em desgraça. Lurie é um professor de literatura que não sabe como conciliar sua formação humanista, seu desejo amoroso e as normas politicamente corretas da universidade onde dá aula. Mesmo sabendo do perigo, ele tem um caso com uma aluna. Acusado de abuso, é expulso da universidade e viaja para a propriedade rural da filha.

    O que gostei: Desonra investiga as relações entre as classes, os sexos, as raças, tratando dos choques entre um passado de exploração e um presente de acerto de contas, entre uma cultura humanista e uma situação social explosiva.

    Guadalupe

    ResponderExcluir
  2. quando teremos finalmente Lolita na lista de escolha? não curti nenhum, da lista atual, bem como dos escolhidos recentemente, alternativamente proponho a trilogogia "a crucificação encarnada" de henry miller e "a polaquinha" de dalton trevisan, abraços

    ResponderExcluir
  3. Olá Robles! Polaquinha estava no páreo na votação da reunião passada. Você fez falta lá para decidir a favor do livro do Trevisan e o homem que amava os cachorros acabou vencendo a votação. A polaquinha e Lolita continuam constando de enquetes no blog (apenas a polaquinha) e no facebook (ambos os livros) e "a crucificação encarnada" constará da próxima enquete que eu preparar. Emplacar um livro como Livro do Mês é difícil, o CLIc é muito heterogêneo, mas acaba acontecendo. Lolita quase foi o escolhido no Clube de Leitura Jovem, surpreendentemente. Sabe-se lá de onde chegam as novidades!

    ResponderExcluir
  4. Poema do novaes/ revela de forma concisa e bela a essência do livro do mês!

    ResponderExcluir

Prezado leitor, em função da publicação de spams no campo comentários, fomos obrigados a moderá-los. Seu comentário estará visível assim que pudermos lê-lo. Agradecemos a compreensão.