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3 de outubro de 2013

Convite à produção coletiva. Tema: SOLIDÃO

Solidão segundo Rita Magnago, Evandro Andrade, Sonia Salim, Vera Freire, Novaes/, Elenir Teixeira, Luiz Gawryszewski, Eloisa Helena,

Nas páginas finais de Coração das Trevas, de Joseph Conrad, o narrador nos diz:

“Como eu próprio estive à beira do abismo, compreendi melhor o significado daquele seu olhar, que não podia ver a chama da vela, mas era amplo o suficiente para abraçar o universo inteiro, pungente o bastante para penetrar em todos os corações que batem na escuridão”.

Assim acho que poderia definir a solidão, um coração batendo na escuridão.
Não se trata de diferenciar estar só de solidão, isso já foi feito há muito. O sentido de solidão a que me refiro é precisamente o de me sentir só, quer sozinha ou acompanhada, de me sentir solitária mesmo, profunda, desarmoniosamente e sem escolha só, apesar das múltiplas possibilidades que o mundo, inclusive o virtual, nos esfrega na cara a todo instante, como coisa que afastar esse drama tão humano e intemporal fosse fácil.

Zé Ramalho me salva aqui: ‘se fosse fácil, todo mundo era’ e ainda complementa esta descrição pessoal: ‘um sofrimento esquálido’.


Nada faz sentido nesses momentos em que sou só eu sem nem mesmo mim, onde estou apartada e desgraçadamente vazia e oca e triste, onde a incompreensão sobre mim se alastra como fosse uma cobra comprida, de muitos metros, que desenrola e dá o bote, me apertando o coração, que chora e arrebenta de dor, olha pra dentro do inexplicável nada e apenas escurece, salgando uma alma desamparada e desprovida do seu próprio afeto.

Nem sempre fui assim, no entanto. Em algum momento de minha vida perdi a alegria e a espontaneidade que me deixava tão à vontade perante o que quer que me acontecesse. Talvez tenha percebido que me faltasse algo, embora até hoje não saiba exatamente do que se trate. Não sei quando isso ocorreu, foi algo traiçoeiro. Algum contágio inesperado, um desejo ingênuo de experimentar o que não entendia, de fazer de conta que sentia o que não sentia. 

Nesse jogo de experimentar algo que não estava na minha essência deixou um grande vazio dentro de mim. Tive vergonha de aproximação com o outro e decidi pelo isolamento que tomou posse de todo o meu ser, aprisionando o meu próprio eu. 


Solidão no parque...
Os brinquedos sem crianças,
árvores sem pássaros.
Longe, soa um sino...
Folhas secas pelo chão
e um banco vazio.

Me questiono: o que me levou a tamanha solidão? Culpa minha? Será que esperei demais da vida? Minha alma sensível me levou a devaneios? Continuo esperando e buscando respostas.
Preciso e quero fazer as pazes com minha alegria, minha espontaneidade que sempre foram minha marca...

Sim, havia alegria, havia sorrisos, havia uma vida imensa estampada em meus passos, uma determinação ferrenha de viver, de saborear cada gota de vida, como uma seiva, um sumo doce e refrescante. Eu andava pela vida com um brilho nos olhos e toda essa energia vital. 

Mas um dia, um certo dia, eu disse sim. Estava completamente envolvida e embriagada pela fantasia, disse sim àquela experiência ficcional, deixei-me seduzir, e agora colho como resultado esta solidão tenebrosa, aqui, presa nas páginas deste livro.



Falo muito, gesticulo,
indicando extroversão,
no entanto é apenas fuga
desta enorme solidão...
 
Ah como estou desencantada de tudo, de todos, de mim. Talvez esse sentimento pudesse se atenuar se alguém me abrisse, me visse aqui na estante, me lesse um pedaço que fosse. Que tal essa página?

Ex-tremos

Qual é a maior estrela do Universo?
Qual é o menor animal da Terra?

Julgar extremos, perguntar:
É a nanica, a da terra, a d'agua, a ouro, a prata, a maçã,
a banana mais gostosa?
Ou é a pera, a seleta, a lima, a bahia, 
A laranja que tem mais suco, a que é a mais doce, a menor ou a maior?

Viver extremos, responder:
O extremo da solidão não é ausência do outro,
Perdido na morte ou no desamor
Não é a cama vazia ou a mesa sem par.
O extremo da solidão não dói
É quando o eu é levado pela depressão
E com a ausência do vazio nem sozinhos ficamos.

O extremo do êxtase é quando nos sentimos sós,
Como estrela diferente a iluminar novos caminhos,
Não importa se como Sol, a pequena estrela vizinha,
Ou aquela tão grande e tão longe que só é visível na imaginação.
Não importa se somos como Lua que só reflete ou
Como buraco negro que tudo consome.
Como laranja ou banana só existimos como ex-tremo que nunca existiu.

Talvez esse poema soasse como um pedido de socorro e prosseguissem me conhecendo? Será? Será?

De solidão não falo, não se fala ao mundo de nossa intimidade, de nosso amor, do exercício do ser. Ninguém entenderia. Aqui, neste livro em que me prendi, sem saber como sair, tremo a cada página que se vira, no extremo do que dizem as palavras, esses versos, tento entender os versos: o verso da página, o verso de mim. Este livro é minha prisão, minha solidão, mas, quem sabe, talvez possa ser também minha libertação.

7 comentários:

  1. Nem sempre fui assim, no entanto. Em algum momento de minha vida perdi a alegria e a espontaneidade que me deixava tão à vontade perante o que quer que me acontecesse. Talvez tenha percebido que me faltasse algo, embora até hoje não saiba exatamente do que se trate. Não sei quando isso ocorreu, foi algo traiçoeiro. Algum contágio inesperado, um desejo ingênuo de experimentar o que não entendia, de fazer de conta que sentia o que não sentia.


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  2. Nesse jogo de experimentar algo que não estava na minha essência deixou um grande vazio dentro de mim. Tive vergonha de aproximação com o outro e decidi pelo isolamento que tomou posse de todo o meu ser, aprisionando o meu próprio eu.

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  3. Me questiono:
    O que me levou a tamanha solidão?
    Culpa minha?
    Será que esperei demais da vida?
    Minha alma sensível me levou a devaneios?
    Continuo esperando e buscando respostas.
    Preciso e quero fazer as pazes com minha alegria, minha espontaneidade que sempre foram minha marca...

    Vera.

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  4. Sim, havia alegria, havia sorrisos, havia uma vida imensa estampada em meus passos, uma determinação ferrenha de viver, de saborear cada gota de vida, como uma seiva, um sumo doce e refrescante. Eu andava pela vida com um brilho nos olhos e toda essa energia vital. Mas um dia, um certo dia, eu disse sim. Estava completamente envolvida e embriagada pela fantasia, disse sim àquela experiência ficcional, deixei-me seduzir, e agora colho como resultado esta solidão tenebrosa, aqui, presa nas páginas deste livro.

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  5. Excelentes produções.Parabéns a todos!
    De solidão não falo, não se fala ao mundo de nossa intimidade, de nosso amor, do exercício do ser. Ninguém vai entender.

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  6. De solidão não falo, não se fala ao mundo de nossa intimidade, de nosso amor, do exercício do ser. Ninguém entenderia. Aqui, neste livro em que me prendi, sem saber como sair, tremo a cada página que se vira, no extremo do que dizem as palavras, esses versos, tento entender os versos: o verso da página, o verso de mim. Este livro é minha prisão, minha solidão, mas, quem sabe, talvez possa ser também minha libertação.

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  7. Pedi a Rita o favor de corrigir minha redondilha, no 3º verso, uma vez que, por engano, não remeti a já corrigida, Creio que ela ainda não teve tempo, por isso corrijo:

    No entanto é apenas fuga
    Elenir

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