"Você está pensando em se matar?"
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Os sinais do suicídio
Champignon - músico do Charlie Brown Jr.
"É possível viver no desespero sem desejar a morte?"
"... a juventude não vê as coisas que a circundam no presente imediato, mas quer ver o que a espera no futuro longínquo. Mas no futuro não há nada, não pode haver, tudo aquilo que nos diz respeito está no presente. Com o passar dos anos, pensa-se sempre menos no futuro e sempre mais no presente. Ou talvez no passado, ..."
Eu dormia, dormia,
De um sono profundo acordei:
Profundo é o mundo,
E mais profundo que nos pensamentos do dia.
Profunda é sua dor,
Prazer - mais profunda ainda que o sofrimento:
Diz a dor: morre!
Mas cada prazer quer a eternidade,
- Quer profunda, profunda eternidade.
(Nietzsche)
"No meu lugar, sentia-me mais uma vez no estado de espírito desconcertante, e que para mim não era novo, de estar desesperado por não estar desesperado. Isto é: o desespero estava incubado no fundo de minha alma, como para sempre; mas isso não me impedia de apreciar o lindo dia, a paisagem magnífica, a boa comida e, naturalmente, a beleza áspera e ambígua de Trude. Poderia ser a chamada estabilização (do desespero) que eu perseguia há tanto tempo? Seria o desespero estável e normal que permite gozarmos o próprio prazer da vida, aliás gozá-lo ainda mais, já que não esperamos mais nada? Mas, em lugar da estabilização, tudo isso não ameaçava levar-me a uma espécie de hipocrisia? A sentir-me desesperado e, ao mesmo tempo, a comer e beber à vontade, a fazer amor sem remorsos e a exaltar-me liricamente com a natureza?"
Heinrich Kleist & Henriqueta Vogel
by kar2nist |
Duplo suicídio?
Um "belo" suicídio a dois, à moda de Kleist: Lucio flerta com o suicídio por desespero, enquanto Beate por razões estéticas.
"Aquele que ama a vida com prudência, já está moralmente morto, pois sua mais intensa força vital, que é de podê-la sacrificar, atrofia-se, quando ele cerca-se de cuidados". (Heinrich Von Kleist)
Camus inicia sua obra "O mito de Sísifo" afirmando: “Só há um problema filosófico verdadeiramente sério: o suicídio”;
Emil Cioran flerta com o suicídio e se indaga: "Por que eu não me mato?” Em outro momento ele responde: “faz bem pensar que a gente vai se matar”;
Assim falava Nietzsche: “A ideia do suicídio é um poderoso consolo: ela ajuda a passar mais de uma noite ruim”;
Para os estóicos “o suicídio é visto como um ato de razão";
Para Tomás de Aquino "o suicídio é sempre pecado mortal, porque vai contra à caridade e à lei natural”.
Dante lança ao fogo do inferno todos os suicidas;
Para Kierkegaard, "o suicídio é o sinal mais claro de que o indivíduo deixou-se vencer pela doença mortal, o Desespero";
Lucio, protagonista do livro do mês de Outubro no CLIc quer estabilizar o desespero, seja porque o considera a condição normal da existência humana, seja porque se sente fascinado pela questão, sobretudo, do duplo suicídio como um possível ato de amor. O desespero do personagem é um tanto superficial, não se comparando ao sentimento expresso nas citações filosóficas de acima. Longe disso! A trama se desenrola num espírito totalmente diverso, divertida. Ele chega ao ridículo de se desesperar por estar se sentindo maravilhosamente bem em usufruir das delicias de um banho de mar na ensolarada Piccola Marina. Sem dúvida que se trata de uma narrativa bem humorada e irreverente, seu desespero sendo, talvez, uma forma de atrair a cumplicidade do leitor em sua aventura bizarra de intelectual burguês. O desespero para Lucio me parece apenas um conceito. A suposta vontade de cometer um suicídio duplo é puro jogo de cena, resulta de uma mescla de desejo erótico e fascinação mórbida. Não garanto, no entanto, que seja isso que o leitor vá encontrar nas páginas de "1934". Prepare-se para o inesperado. "Profundo é o mundo, e mais profundo que nos pensamentos do dia".
Vamos debater a psicologia do suicida em outubro no Clube de Leitura Icaraí sob a batuta do psicólogo e escritor Mike Sullivan, autor de "Terapia das almas suicidas", para quem a literatura o tem salvado do aniquilamento total.
Capri |
"Assim, iniciou-se uma espécie de diálogo entre os nossos olhos, que durou até o momento em que o vapor entrou no porto de Capri. Eu a olhava e ela me olhava. Com surpresa, descobria qualquer coisa que sempre soube, mas nunca experimentei, isto é, que com os olhos se pode não apenas comunicar, mas também falar de maneira particular e distinta... "
A obra "Melancolia I (1514), de Albrecht Dürer (© Trustees of the British Museum), autorizada sua publicação no livro comemorativo de 15 anos do Clube de Leitura Icaraí, estará em evidência, também, por ocasião do debate de 1934, do italiano Alberto Moravia.
"Amo-o e sei que você também me ama, mas entre nós dois não existirá nada mais do que olhares. Uma verdadeira e completa relação entre nós é impossível."
Alberto Moravia |
Birth: | Nov. 28, 1907 |
Death: | Sep. 26, 1990 |
Writer. Born Alberto Pincherle, he was a major figure in the 20th-century Italian literature. In the 1930s he worked as a foreign correspondent for several major Italian newspapers and he travelled in the U.S., Poland, China, Mexico, and other countries. His works were censored by Mussolini's government, and placed by the Vatican on the 'Index librorum prohibitarum' (Index of Forbidden Books). Several of his books have been filmed, among them "Two Women" by Vittorio De Sica, "A Ghost at Noon" by Jean-Luc Godard" and "The Conformist" by Bernardo Bertolucci. Later in life, he entered the world of politics and represented Italy in the European Parliament from 1984 until his death. (bio by: MC)
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Ceci, por trás do teu fascínio por 1934 de Alberto Moravia, na verdade, não está o encanto que a Ilha de Capri exerce em você? Na Odisseia, de Homero, Capri é o local onde Ulisses coloca cera nos ouvidos dos marinheiros para que eles não ouçam o canto das sereias, e não se "suicidem" nos braços delas, e, por outro lado, pede para que eles o amarrem para que ele mesmo não mude seu objetivo de voltar à Ítaca ao vivenciar os en-cantos das sereias. O livro, realmente, é fascinante! Não sei como Lucio, o protagonista, sobreviveu a Beate nessa experiência amorosa no balneário italiano e como nós, leitores comuns, que não temos a determinação de Ulisses, podemos resistir às tentações da proposta estética feita no livro 1934 a respeito do único "problema filosófico verdadeiramente sério" a que se refere Camus em seu mito de Sísifo.
ResponderExcluirAproveite e conte pra nós, Ceci, o que você sentiu visitando Anacapri, local onde se desenrola esse romance tão impactante pra você!
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ResponderExcluirWilliam Shakespeare: Ser ou não ser, eis a questão: será mais...
Ser ou não ser, eis a questão: será mais nobre
Em nosso espírito sofrer pedras e setas
Com que a Fortuna, enfurecida, nos alveja,
Ou insurgir-nos contra um mar de provações
E em luta pôr-lhes fim? Morrer.. dormir: não mais.
Dizer que rematamos com um sono a angústia
E as mil pelejas naturais-herança do homem:
Morrer para dormir... é uma consumação
Que bem merece e desejamos com fervor.
Dormir... Talvez sonhar: eis onde surge o obstáculo:
Pois quando livres do tumulto da existência,
No repouso da morte o sonho que tenhamos
Devem fazer-nos hesitar: eis a suspeita
Que impõe tão longa vida aos nossos infortúnios.
Quem sofreria os relhos e a irrisão do mundo,
O agravo do opressor, a afronta do orgulhoso,
Toda a lancinação do mal-prezado amor,
A insolência oficial, as dilações da lei,
Os doestos que dos nulos têm de suportar
O mérito paciente, quem o sofreria,
Quando alcançasse a mais perfeita quitação
Com a ponta de um punhal? Quem levaria fardos,
Gemendo e suando sob a vida fatigante,
Se o receio de alguma coisa após a morte,
–Essa região desconhecida cujas raias
Jamais viajante algum atravessou de volta –
Não nos pusesse a voar para outros, não sabidos?
O pensamento assim nos acovarda, e assim
É que se cobre a tez normal da decisão
Com o tom pálido e enfermo da melancolia;
E desde que nos prendam tais cogitações,
Empresas de alto escopo e que bem alto planam
Desviam-se de rumo e cessam até mesmo
De se chamar ação.
William Shakespeare
Há algo de sintomático
ResponderExcluirno suicídio estético:
continua sorumbático
e... fétido.
Vida desgraçada mesmo,
ResponderExcluirdaquelas que não têm jeito,
é quando nos propomos ao suicídio
e ele não aceita.
N/
Deixa de lamúrias, novaes
ResponderExcluirsuicídio é coisa de momento
por que querer viver mais
e adiar tanto o sofrimento?
Já tentei 3 vezes me matar
ResponderExcluirna primeira apenas me machuquei
na segunda me lembrei do teu olhar
na terceira eu infeliz acordei.
Por que sofres, ó Anônimo?
ResponderExcluirSerá porque te faltas
um pseudônimo?
Podes assinar "O Astronauta"
ou, quem sabe, algum sinônimo.
A vida? Leva-se na flauta
o ser humano é o maior teônimo.
Meu caro repentista,
ResponderExcluirtenho que te dizer de frente:
se já tentaste 3 vezes e não conseguiste
meu Deus, como és incompetente!
sofro porque a existência é uma barra
ResponderExcluirleve para uns mas para outros pesada
não soube subir na vida na marra
fiquei sozinho sem minha amada
Vejo que és um sofredor
ResponderExcluirpobre e sem amor.
Agora sei porque se atormenta:
nem você se aguenta...
é que o suicídio não me aceita
ResponderExcluiralguma serventia neste mundo devo ter
sempre acho que alguém me espreita
e desisto na hora h de morrer
não fale difícil poeta
ResponderExcluirpara mim parece errado
sou gente humilde analfabeta
só digo verso atravessado
És um suicida tímido? secreto?
ResponderExcluirMas matar-se é um grito para o mundo,
não achas? Afinal, quem assina esse decreto?
Quem é que fala lá no fundo?
prezada Rita Magnago
ResponderExcluirnão sou deveras sem nome
é que no mundo por onde vago
o suicida não passa de um drone
revelação é atributo fotográfico
ResponderExcluirde tempos que não voltam mais
meu suicídio é legado atávico
dos que não têm a sorte de um novaes
Ora, pois, assim seja, oculte-se
ResponderExcluirque ainda mais sabemos de si
e a todo suicida faculte-se
irromper a verdade que eu já vi
a gente vê o que bem entende
ResponderExcluirvê fantasma vê narciso
suicidar o anonimato a toda gente
é tudo que não quero e não preciso
1934 também foi o ano em que Harold C. Urey ganhou o prêmio Nobel por descobrir o combustível da bomba H, o hidrogênio pesado, ocasião em que disse a célebre frase: "Dou mais valor à minha liberdade do que à minha vida".
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