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25 de maio de 2013

Estranho João do Rio


(por: W. B.)

Alguns biógrafos registram seu nome como João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Barreto; outros omitem "Emílio" e "dos Santos". Em que pese o fato de figurar João Paulo Alberto Coelho Barreto nos contratos assinados a partir de 1905, a pessoa em questão é até hoje conhecida apenas como João do Rio (pseudônimo mais comum desse controvertido repórter, cronista, crítico, teatrólogo, contista – autor carioca por excelência).

Nasceu na Rua do Hospício (atual Buenos Aires, Centro) em 5 de agosto daquele 1881, ano que vira o futuro escritor Lima Barreto vir à luz em maio.

Filho de Alfredo Coelho Barreto – gaúcho, professor de Matemática, republicano e positivista extremado – e de d. Florência (bela negra cerca de 10 anos mais jovem que o marido), o menino não foi batizado na Igreja Católica Romana, mas registrado no apostolado positivista contrariando costumes vigentes no Rio de Janeiro, a que mais tarde ele chamaria "Frívola City".

Iniciou vida jornalística com 18 anos no diário "Cidade do Rio", flanou por diversos jornais antes de pousar, 1903, na "Gazeta de Notícias", onde adotou o codinome João do Rio. Permaneceu lá mais de uma década. Suas famosas reportagens dinamizaram o jornalismo da época, então repleto de arcaísmos estéreis e grandes maçadas.

Quase todos atestam colaboração imensa de Paulo Barreto para a Comunicação Social. Depois dele, a imprensa teria mesmo outra fisionomia.

Infelizmente, muito menos gente repara que – além da relevância jornalística – João tem importantes obras propriamente artísticas, literárias.

É impossível não se impressionar com o escritor em "Histórias da Gente Alegre", coletânea de textos de João do Rio, seleção, introdução e notas feitas por João Carlos Rodrigues, publicada pela livraria José Olympio Editora em 1981. Foi uma rara, senão única, lembrança do centenário natalício de Paulo Barreto. O livro tem como subtítulo "Contos, Crônicas e Reportagens da ‘Belle Époque’ Carioca", mas não dá para separar o que ali dentro é trabalho cronístico, conto ou reportagem. João do Rio esgarçou limites entre esses gêneros, tornando-os quase indistinguíveis. Líquido e certo é que ali há texto denso, forte – um soco nos cornos.

Imagino alguém me perguntando: "E soco nos cornos é bom?" Camaradas, a verdadeira arte não é feita para nos acarinhar, mas para sacudir a gente. Quando li "Dentro da Noite", oitavo texto do volume, cheguei a sentir náuseas, porém não consegui largá-lo; ouso dizer que esse conto é comparável aos melhores de Edgard Allan Poe ao abordar perversidades humanas.

Ainda em "Histórias da Gente Alegre", encontramos os ótimos "O Bebê de Tarlatana Rosa", "A Aventura de Rozendo Moura", "A peste"... Há também a reportagem "A Fome Negra" – corajosa denúncia social sobre péssimas condições de vida do trabalhador. Qual jornalista hoje dá oportunidade para populares falarem, opinarem sobre desemprego, jornada de trabalho abusiva, repressão patronal?

Se é tão bom assim, por que João do Rio é pouco editado agora? Não sei. Seus livros sempre venderam à beça. Mais ou menos em 2006, a Companhia das Letras relançou "A Alma Encantadora das Ruas", que esgotou rápido; saiu novamente em 2008 pela coleção Companhia de Bolso, mas essas são exceções... Será que editoras têm preconceito com João do Rio por ele ter sido homossexual, mulato, afetado, obeso e com fortes preocupações sociais? Não duvido.

Quem quiser conhecer também o ambiente literário da época em que viveu esse autor – falecido num táxi nas proximidades da Rua Bento Lisboa, Catete, em 1921 – também apreciará "O Momento Literário", reunião de entrevistas feitas por João com vários escritores. Entre eles há Curvelo de Mendonça, Olavo Bilac, Fábio Luz, Elísio de Carvalho... O livro foi lançado pela Editora Fundação Biblioteca Nacional (Coleção Raul Pompéia) em 1994 na Frívola City – Cidade Maravilhosa para alguns.

(JOÃO DO RIO AINDA NÃO FOI DEBATIDO NO CLUBE DE LEITURA ICARAÍ)

3 comentários:

  1. Winter, adoro ler também João do Rio.Parabéns por suas colocações e trazer tantos informes sobre mais um grande nome de nossa Literatura.
    Com carinho,
    Elô

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  2. Grande Winter, seus textos sempre nos enriquecem e, melhor que isso, trazem à tona escritores brasileiros que não têm sido devidamente valorizados. João do Rio, Lima Barreto, João Antonio... são autores que devemos sempre resgatar. Parabéns. Abs.

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  3. A primeira vez que ouvi falar em João do Rio foi há uns 15 anos atrás, ocasião que minha prima estava fazendo uma pesquisa sobre a obra dele e fui atrás de alguma coisa. Agora os comentários do Winter são de primeira, leitura perfeita de JOão do Rio. Parabéns.

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