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14 de abril de 2013

"Viagens de Gulliver" é para ser lido


(por W. B.)

“Viagens de Gulliver” (Gulliver’s Travels) é um romance escrito pelo irlandês Jonathan Swift (1667-1745) e publicado pela primeira vez, pelo editor Benjamim Motte, em 1726.

Na obra, o personagem narrador é Lemuel Gulliver, cirurgião que veio a se aventurar em viagens marítimas no intuito de aumentar seus haveres para melhor viver junto à esposa Mary Burton ao retornar.

À guisa de introdução, há um prefácio (ficcional) intitulado “O editor ao leitor”, assinado por Richard Sympson, e uma “Carta do capitão Gulliver a seu primo Sympson”: o personagem narrador teria dado suas lembranças de viagem a seu primo, para que este, auxiliado por acadêmicos, pudesse ordená-las convenientemente. Curioso o fato de tanto Richard quanto Lemuel negarem responsabilidade sobre o escrito – o editor só teria publicado as memórias do outro, enquanto o viajante teria tido seu relato modificado com supressões e acréscimos descabidos.

A narrativa propriamente divide-se em quatro partes: I - Viagem a Lilipute (composta por oito capítulos); II - Viagem a Brobdingnag (oito também); III - Viagem a Laputa, Balnibardi, Glubbdubdrib, Luggnag e ao Japão (nove segmentos), e IV - Viagem ao País dos Houyhnhnms (12).

A descrição das sociedades que Gulliver vem a conhecer parece trazer em si críticas na verdade destinadas aos países europeus. Em Lilipute, por exemplo, nação de homens diminutos cuja altura não chegava a seis polegadas, as politicagens, corrupções e atitudes antiéticas em geral são bem parecidas com as conhecidas na Europa. Apesar de seus habitantes gigantescos, também não existe grandeza moral alguma em Brobdingnag, terra repleta de semelhanças com a européia.

A única ilha com seres virtuosos é o País dos Houyhnhnms, mas esses não são humanos e sim cavalos. Os homens nativos (lá chamados yahoos) são animalizados e de hábitos grotescos, porém análogos a práticas correntes na Europa como: bebedeiras, brigas, avareza, desonestidade... Por outro lado, os cavalos (houyhnhnms) nem sequer tem uma palavra em seu idioma para designar “mentira”.

Já há algum tempo abundam adaptações para crianças de “Viagens de Guliver”, que – a pretexto de divulgar a obra de Swift – desvirtuam completamente sua criação, a qual nunca foi destinada à infância. Aliás, o escritor nem gostava de crianças e nunca escondeu isso.

Há trechos claramente voltados para um público maduro como, por exemplo, a parte na qual se insinua que moças gigantes de Brobdingnag usavam Gulliver como um brinquedinho sexual, obrigando-o a escalar seus seios. Não é nada tão explícito a ponto de desvirtuar algum leitor criança, mas é fato que a densidade dramática, a ironia mordaz, a complexidade da linguagem e os temas abordados não são próprios a essa faixa etária.

Não se trata de proibir os mais jovens de ler a narrativa, mas sim disponibilizar também a eles a versão integral do texto, para que leiam – se quiserem e conseguirem – o livro todo ou trechos selecionados por eles próprios. É preferível que pulem páginas consideradas chatas ou difíceis, a serem enganados com versões simplórias e falsificadas do texto de Swift. Por isso o escritor Daniel Pennac afirma, em seu livro “Como um Romance”, o leitor ter “direito de pular páginas”, para, aos poucos, desvelar de forma autônoma aqueles livros ainda não plenamente acessíveis a ele.

Porém o mais importante mesmo é que os adultos hoje descubram "Viagens de Gulliver", livro feito, aliás, para eles. É um tesouro posto a sua disposição, sem que se precise arriscar a vida nos mares como um personagem de romance aventuresco setecentista.

(JONATHAN SWIFT AINDA NÃO FOI DEBATIDO PELO CLUBE DE LEITURA ICARAÍ)

Um comentário:

  1. Winter,antes de chegar ao fim,sabia ser seu o texto. Vc tem seu estilo, gostos, ideias, já reconheciveis.Parabéns pelo texto e pela divulgação feita sobre a liberação de livros(e-mails).
    Sua admiradora agradecida,
    Elô

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